No passado domingo, no encerramento do congresso do PSD Madeira, Passos Coelho afastou qualquer ideia de revisão constitucional para breve, não obstante ser esse um dos temas de eleição do gauleiter madeirense, que aliás, logo de seguida, afirmou ir insistir nessa tecla, para ele, a causa de todos os (seus) problemas..Há porém que reflectir um pouco e reconhecer que o primeiro ministro tem razão: para quê a estafa de uma revisão constitucional para a qual teria de negociar com os socialistas os 2/3 necessários, se materialmente o governo se encarregou já de fazer uma revisão completa ao país, cortando direitos sociais, a natureza tendencialmente gratuita do serviço nacional de saúde e o ensino obrigatório gratuito (em risco), o princípio da igualdade, e até o que consagra a independência do exercício do mandato dos deputados? Face a uma Constituição que não passa de empecilho e perante um governo clarividente e empenhado, este tratou já de a enxotar para o caixote da História, resquício dum Abril de doidivanas, que até queria uma sociedade justa e igualitária, assumindo com realismo e mão firme o que todos já sabemos pela pior maneira: quem quer vícios, paga-os, e se o voto é a arma do povo, desta vez ao usá-lo ficou totalmente desarmado.
Esquecem os revisores no terreno, porém, que a soberania reside no povo, que o direito de resistência está consagrado nas declarações universais dos direitos do homem, e que há uma sociedade pré-constitucional para quem o direito natural prevalece, e que, sempre que os direitos vertidos em lei passem a semântico exercício de retórica, podem os povos tomar nas suas mãos o seu destino, como já várias vezes ocorreu na nossa História. Inconstitucional não foi o Mestre de Aviz matar o conde Andeiro e apear a aparentemente legítima D. Beatriz? Inconstitucional não foi a proclamação da República, o Estado Novo e o 25 de Abril, questionando o status quo ante? Face à inconstitucional violência que se abate sobre o país em nome dum estado de necessidade não desculpante, há que ponderar a possibilidade de reagir com igual violência, em desculpante legítima defesa, se necessário. Isso, até o artº 21º da actual Constituição garante, e chegado o momento em que se tenha de roubar para comer ou dar de comer aos filhos, não há Constituição que resista, revista ou por rever. O Estado de Direito está no fio da navalha.
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