segunda-feira, 9 de maio de 2016

Urbanismo e Economia



O planeamento enquanto processo evolutivo, deve ser um processo de negociação, debate, transparência e participação que permita aos atores e agentes económicos sociais e culturais verter para um quadro actualizado as preocupações com o desenvolvimento, analisando as patologias e virtualidades dos instrumentos de gestão territorial, muitos ainda de 1ª geração, na mira do Território que queremos no futuro.

Nessa perspectiva, há que saber adaptar o planeamento à economia, tendo em conta não só o Território que temos e o que se quer, mas visando que ele seja um factor redistribuidor no plano económico, justo no plano fiscal, e propulsivo no plano do investimento, criando em condições de justiça, equidade e proporcionalidade condições para uma Economia do Território.

Há que aprender com os erros do passado, delinear cartas de redes, e assim planear o seu modus operandi, reforçar o papel de autoridades locais como as dos transportes, por exemplo, bem como agilizar o processo da elaboração dos planos, em actualização permanente e abertos ao escrutínio dos seus destinatários finais, os cidadãos.

Há que adoptar critérios de Governação do Território que deixem aos planos directores sobretudo um papel de estratégia, e aos planos mais concretizados a acção e intervenção necessárias.

Para tanto, há que ponderar a possibilidade de elementos urbanos em espaços rurais pois o conceito de espaços delimitado é demasiado estanque e redutor, deixando de fora os direitos dos proprietários rurais, suas famílias e actividades económicas (extinguindo-as, na prática); definir quais serão as áreas urbanas programadas, reduzir as áreas urbanizáveis para critérios de sustentabilidade e adequação com as infra estruturas existentes, de modo a evitar a necessidade de investimentos não programados ou desejáveis, numa lógica de ir atrás, ao invés de ser fio condutor. E prever nos instrumentos de gestão territorial a análise do mercado imobiliário e das mais-valias expectáveis com as intervenções previstas e permitidas, de modo a prevenir a especulação imobiliária.

Papel importante na definição desse novo paradigma foi a nova Lei de Bases da Politica Pública de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo, a Lei 31/2014, de 30 de maio, na qual é claramente perspectivada a dimensão económica das politicas publicas e de regulação do mercado fundiário, visando evitar a especulação, numa óptica não só da sustentabilidade   ambiental mas também da financeira no quadro dos planos de ordenamento do território.

Efectivamente, ao criar uma distinção entre solo rústico e urbano, e ao considerar que todo o solo será rustico até que nele seja aprovada uma edificação, deixa de existir uma restrição à urbanização traduzida no conceito de área urbana ou urbanizável, e tudo passará a depender da demonstração da viabilidade económica e financeira, satisfação dos encargos com as infraestruturas e concomitante apresentação de plano com um programa e cronograma coerentes. Ao deixar de se consagrar um direito potencial de construção, obrigar-se-ão os proprietários a desenvolver um processo para obter o direito a tal desiderato, enquadrado pelo interesse público municipal e não pela lógica da captura da renda ou especulação fundada numa mera classificação prévia do solo. O investimento a realizar deverá ser benéfico e reprodutivo, e só nessa base se devem manter expectativas jurídicas ou classificações do solo.

Há que proceder segundo critérios de eficiência e sustentabilidade financeira, sem descurar a coesão territorial e numa óptica redistributiva.

Investir na construção deve ser precedido da demonstração dum interesse económico particular e público, de critérios de escala e dimensão ponderados e da interligação com as redes de infraestruturas, e as expectativas de financiamento devem acolher a ponderação destes critérios, bem como os sistemas de taxação, devendo os instrumentos tributários, de acordo com esta lei, ter taxas de tributação diferenciadas em função do custo das infraestruturas, sua utilização e em função também de opções de incentivo ou desincentivo justificadas por objectivos ambientais e de ordenamento do território.

Também o valor do IMI deverá depender de contraprestações prestadas pelos municípios aos proprietários, atendendo aos investimentos efectivamente realizados em habitação com fins sociais, infraestruturas e equipamentos, reabilitação urbana e ambiental, etc, como determina o artº 63º da Lei 31/2014.Para tanto, devem os municípios elaborar programas de financiamento urbanístico que integrem um programa plurianual de investimentos municipais na execução, manutenção e reforço das infraestruturas, a previsão de custos de gestão urbana, e identifiquem as fontes de financiamento para cada um dos compromissos previstos.

O regime tributário do segmento urbanístico deve contemplar a regulação eficiente do mercado fundiário e imobiliário e, nesse âmbito, todos os impostos, taxas e contribuições deverão ser redireccionados tomando em consideração critérios de eficiência e de justiça na angariação de receita e na realização da despesa. O IMI, na sua vertente da tributação de prédios urbanos, deve consagrar o princípio da equivalência ou do benefício, determinando-se que a sua receita bem como as respectivas taxas deverão ser alinhadas com os custos municipais com a manutenção e amortização de infraestruturas locais e gerais.

Foram identificadas como Questões Estratégicas no quadro das realidades de Sintra: a preservação e valorização do Património e da Identidade; a valorização dos recursos existentes e dos ecossistemas; a optimização e qualificação do solo urbano, e das suas redes, como suporte à qualidade de vida; e o apoio a uma economia dinâmica, inovadora e competitiva.

Vive-se em Sintrra um momento de dinamismo na área do Planeamento, tendo-se concluído já a fase de discussão pública do Plano de Urbanização da Serra da Carregueira, com uma área de 194,92 há (aprovado já na Assembleia Municipal, em 17 de Setembro de 2015) bem como o Plano da Abrunheira Norte. Esteve em discussão pública o Plano de Pormenor da Praia do Pedregal, no Magoito, e deram-se passos decisivos na definição e operacionalização das Áreas de Reabilitação Urbana do Centro Histórico de Sintra (ARU-CHS) e de Mem Martins/Rio de Mouro, cujos programas estratégicos de reabilitação urbana foram já aprovados pela Assembleia Municipal. Também já esteve em discussão pública o plano da ARU para a zona da Agualva, numa demonstração de vontade de acelerar e facilitar os processos de planeamento para melhor enquadrar os investimentos e as cidades que queremos no futuro. Há porém que combater a sobreposição de planos e entidades, que não permitem à autarquia uma assunção plena do seu papel, sendo certo que é a única com génese democrática e escrutinável, e reduzir as jurisdições de decisão; incrementar a fiscalização da legalidade, fazendo valer a sua natureza preventiva, e desincentivando intervenções ilegais no território, em prol da prossecução dos principais elementos identificados como carecendo de melhorar no concelho: os serviços de saúde, a segurança, o emprego, as acessibilidades e estacionamento, os equipamentos de lazer e os espaços verdes.

quinta-feira, 5 de maio de 2016

Para quê o Acordo Ortográfico?




Hoje é o Dia Internacional da Língua Portuguesa, ocasião para uma vez mais protestar contra o Acordo Ortográfico. Camões e Castilho adoptaram a escrita fonética, Herculano a etimológica, em 1911 uma reforma ortográfica, conhecida como Reforma de Gonçalves Viana, aboliu muitas das duplas consoantes e privilegiou a pronúncia em prejuízo da etimologia, como ocorreu durante a Idade Média. O Brasil ficou de fora dessa reforma, e seguiu ortografia diferente, sendo que em 1940 Portugal adoptou um Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa e em 1943 o Brasil um Formulário Ortográfico. Em 1990 foi adoptado um novo acordo ortográfico, que privilegia o critério fonético em detrimento do etimológico, em vigor no Brasil desde 2009 e ratificado pelos países de língua oficial portuguesa em 2010. Em Portugal, adoptado gradualmente nos meios de comunicação social, o acordo modifica 1,6% das palavras do português europeu e 0,5% das do português do Brasil, entre 110.000 palavras estudadas.



Sendo o Acordo Ortográfico uma convenção internacional depende antes de mais da sua entrada em vigor na ordem jurídica internacional, o que ainda não ocorreu, por Moçambique e Angola não o terem ratificado, recusando os efeitos do protocolo modificativo de 2004 que prevê que entre em vigor desde que três países o ratifiquem. Acresce que o próprio acordo exige que antes da sua entrada em vigor os Estados signatários assegurem a elaboração de um vocabulário ortográfico comum da língua portuguesa, o que não foi feito sequer.



É o uso e o senso comum que faz uma língua, e mais importante que a ortografia é a dinâmica linguística que faz, por exemplo, que sejam indiscriminadamente introduzidos muitos anglicismos sem tradução adequada, decorrentes do mundo globalizado onde as expressões económicas ou informáticas entram sem sequer se dar muita ênfase à sua tradução, acentuando um novo-riquismo cultural e o peso das relações de força dominantes (rating, bullying, carjacking, upload, delete, ipod, e muitas outras). Por outro lado, foi alguma vez redutor para a expansão do inglês a existência de um inglês britânico, americano, africano ou caribenho? Ou o castelhano da Europa e o da América Latina?



A diferença enriquece, e é património. Afirmar uma unidade fonética é falacioso pois um português, angolano ou brasileiro pronunciará sempre a mesma palavra de forma diferente, e não é por escrever diferenciado que um português não entenderá um livro de Jorge Amado ou um brasileiro um de Lobo Antunes, as diferenças aí serão culturais, ressaltando-se mesmo que por vezes a língua se torna difícil de apreender não pela grafia mas dentro do seu grupo de falantes pelos regionalismos ou pelas expressões caídas em desuso e produto de épocas históricas. Aliás, se o critério era dar primazia ao fonético porque não caiu o h em homem, húmido ou outras em que o h é mudo?



Por estes motivos, enquanto não for legalmente imposto o uso da grafia revisionista inventada para dar trabalho aos editores, continuarei a utilizar o português de Sebastião da Gama, Agustina, Lobo Antunes e Cardoso Pires. Facciosamente.