Não, a Troika não era
uma dançarina de Leste dum qualquer night-club de Lisboa, nem o gerontocrático
Politburo que dirigiu a União Soviética no tempo de Brejnev. Esta troika com
que diariamente nos atazanam os ouvidos, foram tão só uns capatazes da finança
europeia que ninguém elegeu, impondo medidas que nenhum Parlamento aprovou, não
respondendo perante o Parlamento Europeu, mas tão só perante essa figura
omissa no Tratado de Lisboa chamada “Eurogrupo”.
Sejamos claros: o FMI é
uma instituição vocacionada para as crises de pagamentos, um regulador criado
após Bretton Woods, e tido como o Godzilla dos
desgovernados. Só que se Godzilla assustava e dominava, também destruía tudo à
sua passagem. Já os nossos “amigos” da EU disseram-nos: emprestamos
dinheiro, e vocês fazem esta dieta, não para serem um país melhor e voltar a
crescer mas para ver se ao menos nos pagam de volta.
Submissos, os políticos reúniram com eles a “negociar” profundamente o
draft que já traziam alinhavado, mas como capatazes dos Junots e Beresfords do século XXI. Em Belém, o D. João VI de Boliqueime e sua Carlota Joaquina tudo observaram sem
intervir. Claudique o país mas fique o algarvio “aliviado” a observar cagarras.
A troika pensou na fuga de capitais, no
branqueamento ilícito ou nas off-shores sorvedoras? Não, que se podia afugentar
os investidores. O povo já está habituado, e no
cinto português há mais furos que cinto para apertar. Os municípios queriam
discutir o seu futuro com critérios de respeito pelas populações e tendo em
vista reduzir assimetrias? Não, juntem-nos todos para reduzir as despesas. Os funcionários são parasitas? Há que
desparasitar, esquecendo a troika ser ela um bando de simples
funcionários intermédios, que os chefes (um deles até português, por sinal)nem se deram ao trabalho de cá vir,
deixando a tarefa aos burocratas que puseram o país em
sentido e os políticos a arfar, de língua de fora. Se é certo que é preciso
dinheiro, e há que pagar, seria de esperar um pouco mais de respeito por um país
com novecentos anos, onde os fundadores já muitas voltas devem ter dado no
caixão. Almada Negreiros tinha razão quando dizia que o pior de Portugal eram os portugueses…
A dívida virou obsessão
e as pessoas ,números, em relatórios anódinos dos eurocratas e seus mandantes lá
para os lados do Terreiro do Paço, fugindo os portugueses para um exílio forçado,
escapando dum país que lhes nega Futuro. O Governo tem o isqueiro
da fogueira social, e actua achando que tudo deve ser acatado, louvando os portugueses
como um povo pacífico. Pacífico, mas não manso.
É um direito natural lutar pela sobrevivência, contra a fome e pela dignidade,
sobretudo quando não se contribuiu para o descalabro das contas e nenhum
dirigente político foi levado ao banco dos réus por gestão danosa. Os gregos, temerários, poderão cair, mas cairão de pé, não de cócoras como nós, os “bons
alunos”, apaniguados de Berlim e do diktat financeiro
Dantes havia Europa e
europeus. Agora há os contribuintes alemães e finlandeses, os despesistas
portugueses, os desgovernados gregos e os desempregados espanhóis. E um barco à
deriva, que, afogando-se, ainda dá instruções do navio almirante. Devem os remadores
agrilhoados esperar pelo naufrágio, para só então se tentarem safar? Deve pactuar-se
com o fim dos serviços de saúde, da escola pública, do Estado Social e tudo o
que os arautos do Portugal de sucesso fizeram para voltarmos a ser o país da tanga?
Tal como o cão de Pavlov, sem osso não há saliva, mas pode haver dentada. É pois
de prever que a resistência tenha um limite, que se sente nos assaltos e roubos
que preenchem os noticiários dos jornais e tablóides, na violência doméstica,
nas depressões e nos ajuntamentos de massas, só se arranjando escape nas novelas do futebol ou destilando fel nas redes
sociais.
Esquecem muitos que foi em Portugal que se queimaram judeus,
se executaram os Távoras, que aconteceram lutas fratricidas entre liberais e
miguelistas, que um rei e um presidente foram assassinados no século XX, a par
dos exemplos pouco pacíficos da camioneta fantasma, da Carbonária ou das FP-25.
Como escreveu o poeta
Aleixo “Vós que lá do vosso Império/Prometeis um mundo novo/ Calai-vos que
pode o povo/ Querer um mundo novo a sério".
Quererá?
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