segunda-feira, 13 de março de 2017

Alagamares: Venham mais doze!



Nunca devemos julgar que aquilo em que acreditamos é efectivamente a verdade, escreveu um dia Agostinho da Silva, daí a necessidade de questionar, ouvir e duvidar sempre, numa dúvida que cria e reconstrói, esse o desafio de quem quer pensar  no pleno exercício da liberdade.

Foi há 12 anos já, poucos na História do tempo, mas um intenso tempo de regeneração para aqueles que quiseram sair do conforto da passividade, e do pessimismo militante para a militância optimista, o desassossego e um renovado sentido da vida em sociedade.

E assim rimos em convívios e discussões, tomámos posições fugindo ao cómodo limbo das meias verdades, juntámos artistas, escritores, ativistas, decisores, não para a crispada conspiração do cliché mas para uma límpida e generosa busca de caminhos, soluções, para ser parte de algo, com as pessoas e nunca contra elasm senão as que neguem o direito a ter ideias.

Em mais um aniversário, agradecemos a presença dos muitos amigos e companheiros deste projecto que numa fria noite de Inverno juntou um punhado de idealistas nas saudosas Caves de S. Martinho, quando com generosidade partimos para a aventura de ser solidários ainda que por vezes solitários, idealistas mas nunca idiotas, empenhados no desempenho e chamando aqueles e aquelas que têm coisas para dizer e desde então quiseram dizer presente.

Vivemos na era do Me, Myself and I, do hedonismo egoísta e do Eu como centro de todas as coisas, em que todos têm uma página numa rede social mas onde sobretudo explanam estados de alma, fotos de si próprios, partilhando vulgaridades e apregoando solidariedades frívolas com pessoas e causas, que deviam ser simples e desinteressadas. Aí se destilam ódios, rancores, frustrações e silêncios desde chingar o clube de futebol adversário, exibir o cão, a foto do filho pequeno, ou o  marisco que se foi comer à beira mar, tudo desabafando no confessionário digital, à espera de caridosos likes, veniais lols ou dum qualquer emoji repetido pela enésima vez.

O Homem Narcisista em que muitos nos tornámos não acredita no futuro, é pressionado pelo individualismo competitivo, ansioso, entediado, cínico e supérfluo, produzido para consumo imediato. O “eu primeiro” e a falta de percepção do outro chega a extremos em alguns casos.

Errantes, corremos o risco de virar zombies zurzindo telemóveis e tablets como antes puxávamos das armas no tempo das guerras. Desejamos ser compreendidos, mas dispomo-nos a compreender cada vez menos, queremos ser ouvidos, mas não ouvimos senão a nós mesmos.

Todos os dias vemos nos media o quanto o respeito ao próximo é aviltado e o quanto é mais importante TER do que SER, numa distorção dos vínculos afetivos sem limites ou parâmetros. Ouve-se e vive-se a falta de perspectiva ou de sentido no trabalho, na educação, na saúde, na vida.

Essa falta de perspectiva decorre da convicção de que há que aproveitar o dia de hoje, pois teme-se o amanhã. Para quê estudar, se não haverá trabalho no futuro? Para quê dar o melhor de si no trabalho, se se pode ser despedido a qualquer momento?

Falta comprometimento, e isso é fruto da falta de perspectiva. Como buscar objectivos de longo prazo numa sociedade com valores e expectativas a prazo? Como manter relações duráveis se o que se busca é o imediatismo?

Este Admirável mundo global da Comunicação é afinal um esquizofrénico mundo de solidões gritadas para amigos virtuais que mais não são que surdos electrodomésticos, onde a emoção, a demonstração da amizade ou a opinião são estereotipados e a massificação das emoções virou um ritual

É na revolta contra este estado das coisas que continuamos na Alagamares animados por valores, sem certezas nem dogmas, a não ser o de que o futuro já não é o que era.

Em dia de festa, não quisemos deixar também de homenagear alguns de nós, pois não somos anónimos ou números.

Não quisemos deixar de lembrar um cidadão ativo e presente como o Pedro Macieira, testemunha ocular da predadora mão humana na paisagem, da beleza parnasiana do voo duma garça no rio ou duma flor clorofilando os ares. Com o seu blogue de referência, o Rio das Maçãs, quase contemporâneo da Alagamares, tem sabido pela acutilante imagem e pela pertinente insistência em causas comuns amar Sintra e as suas gentes. Com Pedro Macieira, o repórter está sempre lá, bombeiro das causas da polis, cronista dos dias simples ou marcantes.

No David e na Ilesa, temos particulares amigos e parceiros, devotados à causa das artes, onde se mesclam os sons da cidade gutural com a sonoridade açucarada da África virginal. Mais que um projecto musical, a Uno é um projecto de solidariedade, a que souberam dar sentido, eles e mais companheiros, com o trabalho desenvolvido no apoio à grande mátria lusófona, a todos inspirando e motivando.

Em Sérgio Luís Carvalho homenageamos um senhor da palavra escrita, que trata a História como um fresco e onde qualquer um de nós poderia ser parte das tramas apresentadas. Autor, entre uma vasta obra, do celebrado Anno Domini 1348, ano em que a peste ceifou Sintra, ao lermos essas páginas palpitantes sentimos que também estivemos lá, pelo epidérmico da sua escrita, iluminura resplandecente e singela. Nele queremos hoje celebrar a obra consistente e didática dum autor de Sintra e que em Sintra situou também algumas das suas histórias e enredos

Agradecer também ao Grupo Desportivo e Cultural de Galamares, ao Ardecoro, à Uno, ao Conservatório de Música de Sintra, ao Ars-Collares-Trio, ao duo de guitarras de Queluz, ao Paulo Campos dos Reis e a todos os companheiros destes 12 anos, às instituições, parceiros e amigos que connosco colaboram, pelo seu empenho e contributo, que em nada nos surpreende, pois sabemos com quem contamos.

Já no dia 25 vamos fazer a nossa Caminhada da Primavera, e plantar 50 árvores na Tapada de Monserrate, bem como apresentar o novo livro de André Freire “Para lá da Geringonça”. Dia 9 de Abril vamos reunir políticos e pensadores no News Museum para o primeiro de um ciclo de debates sobre a pertinência das ideologias quando passam 100 anos da revolução russa. E empenhadamente, continuaremos a dar contributo crítico e positivo para as questões que nos convocam como cidadãos empenhados, da recuperação do património material e imaterial às questões do ordenamento do território, da promoção dos artistas e criadores locais, do ambiente, da memória histórica ou na área da solidariedade social.

Escreveu Albert Camus “A verdadeira generosidade para com o futuro consiste em dar tudo ao presente”. Somos deste presente, e queremos dizer presente.

Vivam os que lutam, sonham, sofram e fazem andar o mundo!

Vivam os que querem uma Sintra criativa, inclusiva e com massa crítica!

Vivam os que com o seu empenho e emoção constroem a Liberdade pela afirmação de espaços de tolerância, diálogo, confronto de ideias e quebrando inércias.

Viva a Alagamares, espaço onde não há o Outro, mas o Nós, soma de eus e não de Egos,

Uma dúzia já está. Aguardem-nos para mais doze!

 


 

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