Foi a 9 de
Março de 2005 que um punhado de sintrenses fundava no desaparecido café das
Caves de S. Martinho a Alagamares, e nunca mais até hoje parou, ocupando um
espaço em aberto no nosso panorama local.
Com mais de
150 iniciativas e eventos realizados, a Alagamares interagiu com a sociedade, e
nela bebeu experiências, tentou rasgar caminhos e ser agente de mudança, um
parceiro e actor cultural, para tanto se balizando pela discussão e abordagem
permanente de assuntos novos ou em novas perspectivas. Como disse Miguel de
Unamuno, “a erudição é, em muitos casos, uma forma disfarçada de preguiça
intelectual ou um ópio para adormecer as inquietações íntimas do espírito“. Não
somos um núcleo de eruditos, mas continuaremos a ser artífices e artesãos do
Saber, sem dirigismos, dogmas ou espírito de capela, assim cumprindo a nossa
missão de cidadãos. A participação entusiasta e crítica nas actividades e na
vida associativa tem sido a pedra angular do sucesso e eficácia da nossa associação,
cujo objectivo é o da promoção da cultura, da região de Sintra e dos seus
associados. Em tempos de anemia financeira, não permaneceremos anémicos mas
interventivos, cientes de que a cidadania activa deve ser congregadora de
sinergias. Rejeitamos a desistência e com entusiasmo e pés no chão proclamamos
a nossa vontade de afirmar a Cultura
como um dever social e a acção mobilizadora como propulsora de novos
horizontes.
Nestes 10
anos, além da Alagamares, Sintra viu surgir grupos como o Danças com História,
o Sintra Estúdio de Ópera, a Três Pontos, a Voando em Cynthia, a Dínamo e o
Ardecoro, a revista digital Selene, blogues de intervenção cívica como o Rio
das Maçãs, Sintra do Avesso, Retalhos de Sintra, Sintra Deambulada, O Reino de
Klingsor, Tudo sobre Sintra ou Serra de Sintra, os Encontros de Alternativas, o
trabalho de grupos como o Chão de Oliva, o teatromosca, o Teatrosfera, o Utopia
Teatro, o byfurcação ou a Musgo. Restaurou-se o Chalé da Condessa e a Parques
de Sintra veio mudar o paradigma na abordagem do Património, abriu o Centro de
Ciência Viva, afirmaram-se escritores de Sintra como Miguel Real, Sérgio Luís
Carvalho, Raquel Ochoa, Luís Filipe Sarmento, Filomena Marona Beja, Liberto
Cruz, Jorge Telles Menezes ou Luís Corredoura, fizeram-se tertúlias e
encontros, como os Meninos d’Avó, o Traço Comum, os III e IV Encontro de
História de Sintra, nasceu a Saloia TV. E abriu o Museu de História Natural,
rotinaram-se festivais como o Córtex e o Periferias, a CMS lançou o Tritão, uma
revista digital, e abriu o MU.SA. É todo um panorama que difere dum passado
mais rarefeito e esporádico.
Há muito a fazer, ainda, e nem tudo foram
sucessos, num quadro de redução de verbas e dificuldades de sobrevivência de
muitos agentes culturais e grupos. Desapareceu o Centro de Arte Moderna e o Museu
do Brinquedo, falta dar destino à Quinta da Ribafria, resolver de forma
definitiva os problemas do estacionamento, a violência dos abates e podas
agressivas, o preço das entradas nos monumentos, dar atenção à formação de
públicos, criar um cluster de indústrias da Cultura.
Igualmente muitos
partiram nesta década: Maria João Fontaínhas, Xaimix, Pinto Vasques, Simplício
dos Santos, Maria Gabriela Llansol, António Caruna, Eduardo Lacerda Tavares, M.
S. Lourenço, Ana Daniel, Carlos Viseu, João Benard da Costa, Ernesto Neves,
Cláudio Brito, Bartolomeu Cid dos Santos, José Manuel Conceição, Helena
Langrouva. A sua memória e testemunho nos guiarão na luta por uma Sintra de
Cidadãos, activos e preocupados.
Militar em
associações, e por causas, nos tempos que correm, é mais que nunca um dever
cívico. Vivemos momentos de vigília, e de não deixar que a frágil árvore
desapareça na floresta densa de dificuldades, cortes e silêncios motivados pela
ditadura da dívida e do défice. Nestes dias dum Portugal cinzento, é essencial estimular
a cidadania, e as boas práticas, pugnar pela educação como plataforma para o
conhecimento, descolonizar a memória de imaginários estafados, resgatar a
auto-estima e o “sentimento de nós”, e estimular a identidade que constrói a
nossa idiossincrasia e peculiar forma de estar no mundo. É lançar pontes e
massa crítica, mediar entre o poder público e as comunidades, num trajecto
virtuoso que acentue o pathos de ser português, e sê-lo de modo universalista. É
estar atento, ser parceiro com a lealdade de criticar, acompanhar as obras e
não depois das obras, chamar a agir e interagir, actuar virtuosamente e não
como agente de bloqueio ou imbuído de egoístas vaidades e atrás de
protagonismos. É tocar a rebate no campanário, sangrar a pena revoltada,
cavalgar a comunicação com a serenidade das emergências, visitar, escrever,
protestar, ajudar, ouvir e ser ouvido, passar palavra, dar o murro certeiro e
alertar o adversário, que muitas vezes é simplesmente a inércia, a ignorância, a
incúria ou a miopia. É pugnar pelo valioso presente que resulta da aliança da
memória com a auto-estima, da singularidade com o talento, da polis com os seus
moradores, dos conventos, palácios e moinhos, com a serra, as tapadas ou os
lapiás. É recordar os que trilharam o caminho, erguendo a tocha dos seres
maiores, dos eremitas jerónimos aos dandys novecentistas, dos cavaleiros da
finança aos poetas proscritos, ou do rei artista ao Carvalho da Pena,
jardineiros de Deus na fértil horta de Klingsor.
Neste
momento de festa, o orgulho de sem dinheiro nem alcandorados em capelas termos
feito o nosso percurso independente, sem subsídios ou interesses encobertos,
plurais mas com individualidade, é para nós motivo de orgulho e de afirmação. Não
somos políticos, mas temos interesse nas políticas, e assim prosseguiremos, à
frente e ao lado, mas nunca atrás.
Dez anos estão volvidos,
que venham mais 10 anos.
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