Em Glasgow,
onde decorre uma vernissage de salvadores do planeta, Boris Johnson enfatizou
que falta um minuto para a meia noite e esse é o tempo para fazer o que décadas
de carbonização descuraram. É claro que sem a Rússia, a China ou o Brasil de
pouco servirão as palavras, e lentamente caminharemos para o armagedeão, a
fazer companhia aos dinossauros.
Só para dar
uma ideia do que nos espera, repesco um estudo do prof. Filipe Duarte Santos
sobre o panorama que em Sintra poderemos vir a registar.
Em Sintra,
segundo o "Plano Estratégico do Concelho de Sintra Face às Alterações
Climáticas" coordenado pelo prof. Filipe Duarte Santos, antevê-se que em
meados do século XXI as temperaturas médias anuais subam1.7 a 3.3 °C, com maior
ênfase no Verão (3.6ºC a 5.4°C em julho) do que no Inverno (0.7 a 1.6 °C em dezembro).
No final do século a elevação da temperatura média anual pode chegar a 2 a 3°C
acima do que são atualmente no Inverno e 5º a 10º C no Verão, com ondas de calor
mais frequentes e noites tropicais em que poucas vezes a temperatura descerá
abaixo de 25º C. A precipitação média no final do século baixará de 800 mm para
540 a 700 mm e a radiação solar aumentará até um máximo de 8%.
Haverá
reduções anuais no escoamento dos principais cursos de água na ordem dos -30%
em meados do século e -50% para o final do século, e para os aquíferos é de
esperar uma diminuição da capacidade de exploração sustentável. O impacto no
rebaixamento do nível nos aquíferos será ainda modesto, menor que -0,5 m, mas
para o final do século já alcançará máximos de -0,7 m no final do semestre
húmido, e -0,8 m no final do semestre seco.
O consumo de água dos sintrenses, agora da
ordem de 80 m³ entre 2020 e 2030 será 3% a 15% acima dos valores atuais. O
nível médio do ar continuará a subir, com cenários de 0,2 m a 1,4 m para o
horizonte de 2100.
Fenómenos de
precipitação intensa irão promover a erosão das arribas, e a modificação do
regime das ondas associada às alterações climáticas deverá aumentar a deriva
litoral e, portanto, o potencial de transporte de sedimentos, predominante para
sul, em até mais 20% em relação à situação atual. A configuração das praias
aponta para reduções da superfície dos areais, embora muito variáveis de praia
para praia. Nas mais encaixadas e instaladas em desembocaduras fluviais, a
redução será pequena. Pelo contrário, as praias mais abertas, estreitas e
limitadas pelo lado de terra por uma arriba, como a do Magoito, que são
extremamente sensíveis à rotação do rumo das ondas, devem perder grande parte
do areal.
Os cenários
colocados pelos autores do estudo sugerem um aumento do stress ambiental na
vegetação florestal. O stress hídrico poderá tornar as árvores mais suscetíveis
e aumentar os danos causados pelas pragas e doenças.
No futuro
aumentará também o risco de incêndio florestal e a deterioração dos
ecossistemas florestais pela dificuldade de regeneração das árvores e pela
proliferação de espécies invasoras mais competitivas e melhor adaptadas às
novas condições climáticas.
Prevê-se o
aumento da incidência de pragas e doenças, assim como o risco de invasão por
novas espécies de regiões de clima tropical ou subtropical. É também muito
possível que as taxas de crescimento de pragas e doenças sejam estimuladas pelo
aumento da temperatura, sobretudo quando têm a possibilidade de ter várias
gerações por ano.
O aumento
das temperaturas no Inverno, quando acompanhado por humidade elevada, poderá
favorecer a expansão de alguns agentes patogénicos, modificando a estrutura e
composição da vegetação, com consequência para a restante biodiversidade: a
fauna seguirá os destinos do seu habitat e a comunidade de insetos sofrerá com
as alterações climáticas, uma vez que são animais de sangue frio.
Algumas
populações, especialmente aquelas que têm distribuição geográfica limitada,
pequenas áreas de habitat ou reduzido número de indivíduos (como o
cravo-romano, o feto-de-folha-de-hera, o miosótis-das-praias ou a boga
portuguesa), poderão não ter capacidades para se adaptarem às rápidas
alterações climáticas, e a sua extinção pode ocorrer em populações com baixa
taxa de reprodução e capacidade de dispersão.
Dentro dos
mamíferos o grupo dos morcegos é o mais vulnerável, dada a dependência do seu
metabolismo com a temperatura e a sua dieta depender da comunidade de insetos.
Nos répteis e anfíbios deverá haver uma diminuição da sua área de distribuição,
uma vez que são animais de sangue frio e com fraca capacidade de dispersão.
Os cenários
indicam que em finais do século as ondas de calor serão um fenómeno frequente, afetando
grupos mais sensíveis como as crianças e os idosos. O problema do ozono poderá
persistir e agravar-se pelo menos até meados do século e o número de dias
propícios a salmoneloses na região de Sintra aumentará dramaticamente no Verão.
O risco de
transmissão de doenças por insetos subirá em todo o concelho. Mesmo no Inverno
o clima passará de totalmente desfavorável a ocasionalmente favorável. O Verão
continuará de forma geral a ser a estação do ano mais favorável à transmissão,
embora em meados do século o clima se torne tão seco que o risco começará a
diminuir.
As
alterações climáticas em Sintra vão no sentido de aumentar a produção de
pólenes ao longo de todo o século, agravado pela diminuição da precipitação que
promoverá menos a limpeza da atmosfera. A radiação solar aumentará
significativamente, e como o número de dias confortáveis para atividades no
exterior aumentará, tudo se conjugará para um maior risco de melanomas.
Apesar da
vasta área florestal do Parque Natural Sintra-Cascais (3675 ha), o valor anual
de sequestro é de cerca 53 500 toneladas de CO2, ou seja, da ordem de 2% das
emissões de gases com efeito de estufa (GEE) dos sintrenses (âmbito total).
Segundo os autores do estudo, no caso específico de Sintra duas estratégias
surgem como as mais adequadas para sequestro biológico de carbono: o aumento
permanente da área florestada e do número de árvores de arruamento, e o aumento
da duração média das árvores com vista à meta de longo prazo de sequestro de 8%
das emissões de GEE.
Estima-se
que o índice de emissões totais (estritas e implícitas) per capita seja da
mesma ordem do valor médio nacional, ou seja, 8 toneladas de CO2 eq./habitante.
No entanto, este valor pode ser reduzido se houver uma generalização das
energias renováveis, edifícios mais eficientes, melhores transportes públicos e
mais ciclovias.
Sintra faz
parte desde 2015 do consórcio que irá desenvolver a metodologia do projeto
ClimAdaPT.Local para aplicação a nível nacional das estratégias municipais para
as alterações climáticas, sendo uma das uma das autarquias que já têm
estratégias próprias para os seus territórios.
Porque, como
alertava um famoso programa televisivo de Luís Filipe Costa nos anos 70,
inspirado nos avisos de Gonçalo Ribeiro Telles, “Há Só Uma Terra”…