Sintra, Sintra, quem és, lúgubre emaranhado de árvores,
aracnideamente tecidas em torno de filosofal pedra e granítica sepultura? E
nós, servos da Lua, aluados em torno dessa argêntea luz que
ilumina e também cega?
Homens do Sonho, apesar do mar revolto e seus
adamastores, seguimos-te na senda da Luz, na
Estrada e não na berma deste larvar berço de lendas, mouros e cristãos,
visionários e viajantes, sempre espantados com o odorizado verde e onde em
presépio aninhámos casas, palácios, fontes e miradouros. E guardando, nas ladeiras,
lá estão o Cruges e Calisto Elói, Garrett e Zé Alfredo,
a Llansol e Nunes Claro, e o Carvalho da Pena, o druida da floresta.
Altar de poetas e palpável
Parnasso, cá estão Maria Almira e Rui Mário, Jorge Menezes e Alvim, Miguel Real
e Sérgio Carvalho, e também novos e generosos artistas, rodopiando debutantes em novos bailes com camélias, descobrindo e descobrindo-se à sombra tutelar do Paço.
Hipnotizados miramos o castelo de onde invisíveis ogres à noite lançam caldeirões de azeite e soturnas bruxas invadem o breu montadas em vassouras
de néon. E capturados escutamos os passos do rei prisioneiro ou o ecoar das
festas joaninas, Camões lendo a um rei alucinado e a condessa Elise acorrendo à
Vila, ao repicar do sino em S. Martinho.
Invisíveis faunos e visíveis heróis, incensados e perdidos,
esperançosos e idealistas tomam hoje lugar no camarote do Tempo, com escolta de
pássaros e camélias, anunciando o festim à sombra da branca Lua. E nós na
estrada, e não na berma, laboriosos jardineiros e operários da Pólis.
Contra as trevas, há que estar contra o abate de cada árvore,
na divulgação dos artistas sem ribalta, firmes e com alegria com os expropriados
da fama. Na luta pelo restauro do património que sangra na Vila Velha
ou contra os iníquos depósitos de frustrações a que chamamos cidades. Sangrando
estaremos no desfolhar do livro que é Sintra, esse incompleto missal de
futuros prometidos.
Todo o futuro sem luta mais não será um dia que um passado
desolador. Eis a hora de deixar pegadas, inscrever
Mudança e não o seu desejo, assumir a Sociedade no palco e não num qualquer camarote de vaidades serôdias
Nos dias que hão-de vir, haveremos de nos ver por aí, e
cúmplices, de olhos nos olhos, saberemos quem somos e ao que vimos, e com orgulho escreveremos
a mágica palavra Sintra.
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