Sintra,
espectral viagem, sabendo a serra ao lado, milenar guardiã de lendas, num
presépio aninhando casas, palácios, fontes e miradouros. Em volta se absorvem seus
cheiros e matizes, o silvar ventoso e o perfume da serra. Passo a Correnteza,
miradouro e varanda, parapeito de amores e de pombos, e aproxima-se o burgo, ao
som cadente de cavalos e de pretéritas lembranças. O paço municipal é a porta
de entrada e guardiã fronteira, o leão de pedra a sentinela, palpitam os sentidos
à vista da estrada do Duche, do Grande Maior, das camélias de Nunes Claro, e
parece ver-se o vulto do Carvalho da Pena cavalgando entre eucaliptos penumbrosos. Sintra, utópico altar de poetas, palpável Parnasso onde na noite dos tempos perpassam danças
medievais e bailes das camélias, invisíveis ogres lançando caldeirões de azeite,
perturbantes bruxas invadindo a noite em vassouras, sob o repicar do sino em S.
Martinho, sempre a holográfica viagem por um mundo que não é deste Mundo à sombra duma
argêntea e virginal lua. É apenas uma manhã fria de janeiro, o mês que nos levou Maria
Almira e traz a névoa húmida do spleen e as gárgulas dos dias tristes e
perturbantes.
Só em
Sintra há dias assim, só a Sintra pode um dia regressar D. Sebastião, o de
todas as esperanças e todos os medos, pois Sintra é Adamastor e promontório,
mas também bosques de faunos celebrando a vida e o verde que nos invade e de nós se
apodera.
É
Sintra. É Janeiro. É manhã.
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