quarta-feira, 30 de março de 2016

Os 40 anos da Constituição



Estão a passar por estes dias 40 anos da Constituição de 1976.

Eleita a Assembleia Constituinte, foi a mesma convocada para reunir em sessão instaladora a 2 de Junho de 1975, tendo no acto eleitoral realizado a 25 de Abril de 1975, para o qual existiam 6.231.372 eleitores inscritos, votado 5.711.829 (91,66% dos inscritos), tendo-se abstido apenas 519.543 (8,34%). Concorreram 14 partidos e movimentos cívicos, tendo vencido o PS de Mário Soares, seguido do PPD de Sá Carneiro.

Condicionada pelo Pacto MFA-Partidos, que até à revisão de 1982 consagrou a existência do Conselho da Revolução, essa Assembleia conseguiu num plano dominado pelo PREC elaborar um documento que consagrou uma verdadeira carta de direitos e a obrigação de um Estado Social, hoje largamente em perda. Inicialmente de pendor semipresidencial, foi progressivamente tomando um perfil parlamentar, embora se mantenha a eleição presidencial por sufrágio universal (valerá a pena, para tão poucos poderes?), e foi sendo “desideologizada” à medida que os ecos revolucionários se esfumaram.

Jorge Miranda do PPD e Vital Moreira, então do PCP, foram os mentores jurídicos, tendo tido papel de destaque deputados como Ângelo Correia, Carlos Candal, Lopes Cardoso, Adelino Amaro da Costa, Armando Bacelar, Raul Rêgo, Pedro Roseta, Barbosa de Melo, Mota Pinto, António Arnaut, Manuel Alegre, Etelvina Lopes de Almeida, Carlos Brito, Jorge Campinos, Aires Rodrigues, Vasco da Gama Fernandes, Basílio Horta, Diogo Freitas do Amaral, Sá Machado, José Tengarrinha, Alda Nogueira, Octávio Pato, Magalhães Mota, Pinto Balsemão, Alfredo de Sousa, Helena Roseta, Marcelo Rebelo de Sousa, Arons de Carvalho, Nuno Rodrigues dos Santos, Carmelinda Pereira, Igrejas Caeiro, Marcelo Curto, Medeiros Ferreira, Mário Mesquita,  Sotto Mayor Cardia, Mota Amaral, Jaime Gama, Ângelo Veloso, Emídio Guerreiro, José Augusto Seabra, Leonardo Ribeiro de Almeida, Salgado Zenha, José Niza, Dias Lourenço, José Manuel Maia, Tito de Morais, Amândio de Azevedo, Américo Duarte ou Galvão de Melo.



De Junho de 1975 a 2 de Abril de 1976, quando o Presidente Costa Gomes a promulgou, (foto) foram meses de luta política enquadrada na então exacerbada “luta de classes”, passando por “excrescência burguesa”, como a classificou Álvaro Cunhal ou “ninho de lacraus” na voz do então deputado da UDP Américo Duarte, com sequestros pelo meio (13 de Novembro de 1975, foto)

Um destaque especial para o seu presidente, hoje esquecido: o professor Henrique de Barros (imagem abaixo). Filho do escritor e pedagogo João de Barros e cunhado de Marcelo Caetano, Henrique de Barros foi um distinto engenheiro agrónomo e cidadão sem mácula, a quem coube presidir à Assembleia Constituinte de 1975-1976, tendo sido um paladino da liberdade e do cooperativismo, tendo sido ainda ministro no I Governo Constitucional.

Foi há 40 anos, apenas, tão remoto, contudo.

Perguntam alguns se vale a pena alterar a Constituição. Por mim, creio que não, o sistema actual de checks and balances é correcto e se permitiu até hoje governos de esquerda e de direita, é porque não é aí que residem os problemas nacionais. Note-se que a Inglaterra ainda hoje se rege pela Magna Carta e a Constituição Americana é a de 1776, com meia dúzia de emendas.






domingo, 6 de março de 2016

Dez anos... foi muito tempo






Ao contrário da canção de Paulo de Carvalho, os dez anos de Cavaco Silva na Presidência da República foram anos em que a instituição e o povo se distanciaram, se teve uma visão redutora e formal dos poderes presidenciais, em que a relação com os partidos se pautou sempre por uma “quarentena higiénica” para quem estes- donde ele emergiu, aliás- foram sempre “os agentes políticos”. Mesquinho, vingativo, contabilista mais que visionário, provinciano mais que ecuménico, não obstante ter sido o político português que em democracia mais vezes foi eleito com o voto popular, encarna, no fundo, uma visão paroquial do país de que o Portugal profundo e dos brandos costumes nunca se libertou.

Paradoxalmente, o homem que chamou o Estado de “monstro” foi quem mais o engordou nos loucos anos noventa, o homem do leme que apela ao regresso ao mar foi quem desmantelou as pescas e a frota pesqueira, o homem dito impoluto e desinteressado foi quem ainda hoje não explicou cabalmente as suas relações com o BPN e a clique que desde os seus tempos se instalou na banca e nos negócios, neste novo fontismo de “agenda telefónica” gerador de gestores sem experiência que não a do cartão partidário, filiação numa jota ou assessoria num ministério.

A História dirá o que foi Cavaco nestes anos vertiginosos. Se o Cavaco patrono dos Dias Loureiro, Oliveira e Costa, Miguel Relvas ou Duarte Lima, se o construtor das autoestradas onde ninguém passa ou dos polidesportivos sem atletas, se o reformado que trocou o salário de Presidente pela pensãozita do Banco de Portugal aforrada com o “honesto trabalho de professor”.

Celebremos, para já, a brisa fresca que a partir de 4ª feira tirará o mofo dos cortinados de Belém. Não para que conspirações maquiavélicas ali passem a ter lugar, conhecedores que somos da traquinice do novo inquilino, mas para que a normalidade dum cargo cada vez mais normal reganhe o “espírito do lugar” e espante as teias físicas e mentais que ali moraram nos últimos anos.