Jorge Sampaio completa hoje 80 anos, durante os quais foi espetador e protagonista dos acontecimentos que marcaram a vida nacional entre a ditadura e a democracia. Neto dum oficial da Marinha, o comandante Fernando Branco, que construiu a sua casa de Sintra que durante quinze anos diariamente contemplei da janela do meu gabinete, e onde várias vezes o vi, passeando no jardim, filho conceituado médico Dr. Arnaldo Sampaio, de ascendência judaica pelo lado materno, desde os anos 60 se destacou como líder estudantil na célebre greve académica de 1962, e depois como advogado de presos políticos e opositor à ditadura. Após o 25 de abril, depois duma passagem pelo já desaparecido MES, foi líder socialista, presidente da câmara de Lisboa, secretário geral do PS e presidente da república, num período marcado pela Expo 98, o drama de Timor, o handover de Macau e a polémica demissão de Santana Lopes, em 2005. Sportinguista de sempre, viajado e cosmopolita, depois da presidência abraçou uma agenda internacional que passou pela Aliança das Civilizações, a luta contra a tuberculose e o apoio aos estudantes sírios expatriados. Uma vida de causas, um percurso de mundividências, um olhar humanista e preocupado sobre um mundo que quando assumiu a presidência vira já a primeira guerra do Golfo, a perestroika e a queda do muro de Berlim, e ainda veria o 11 de setembro, a invasão do Iraque e do Afeganistão. Foi, porém, Timor a grande causa nacional do seu período, num esforço do país em corrigir o que a inevitabilidade histórica não conseguiu controlar em 1975, fazendo desse processo a nossa “boa” descolonização, que depois da invasão indonésia em 1975, do massacre de Santa Cruz, da prisão de Xanana em Cipinang e do referendo de 1999 permitiu, numa corrente de solidariedade mundial, que Timor Leste fosse, enfim, a última parcela do império a trilhar os caminhos da autodeterminação e da independência.E todos nós acendemos velas, entoámos a canção de Luís Represas e nos emocionámos com o Nobel de Ramos Horta e Ximenes Belo. Por uma vez, o país estava todo do mesmo lado, em reconciliação com a História, que assim fechava a última página desde que se desembarcara em Ceuta num solarengo agosto em 1415.
Na serenidade dos seus oitenta anos, vividos intensamente, Sampaio é hoje um senador da República, um homem que viveu vários regimes e esteve presente em muitas lutas, escolhendo sempre a barricada da ética republicana e da luta pelo valor supremo sem o qual viver não vale a pena: a Liberdade.
Sem comentários:
Enviar um comentário