A proximidade das eleições
autárquicas leva-me a pensar na extinção da histórica freguesia de S. Martinho,
em Sintra, onde resido, trabalho e cuja história já registei em livro em
parceria com Daniel André.
A extinção da freguesia, por
agregação com Santa Maria e S. Miguel e S. Pedro de Penaferrim, centralizando a
sede da nova União das Freguesias de Sintra em Santa Maria e S. Miguel,
constituiu um acto impensado e atentatório da vontade dos seus fregueses, que,
no mínimo, deveria merecer a consideração de uma justificação adequada,
decorrente de estudos sérios e participados que levassem a essa conclusão, e
que fosse objecto de auscultação da população, pela pronúncia favorável dos
seus órgãos próprios ou pela convocação de um referendo local. Deveria ser
assim, nas democracias. Nesta não. Até porque não foi dada a oportunidade de
exercer o contraditório, por audiência aos interessados, apenas tendo havido
pronúncia das assembleias de freguesia pela não extinção ou agregação em
abstracto. Coisas que um tal Relvas em dias da troika teceu.
S.Martinho, da Vila a Janas e de
Galamares a Nafarros, construiu uma identidade ao longo de décadas em torno das
suas festas, símbolos, colectividades e património. A ela se dedicaram autarcas
como Noel Cunha, Álvaro Ramires, João Pedro Miranda, Adriano Filipe ou Fernando
Pereira, nela se situam várias das instituições emblemáticas de Sintra. Com os
anos, foi das poucas freguesias que viu a população crescer, ampliou e modernizou
instalações e serviços e dinamizou a acção social, pelo que o mínimo exigível
seria o reconhecimento do trabalho feito por autarcas de várias cores mas com
uma só camisola. Com a agregação, que muitos contestaram mas hoje já
esqueceram, não foi S.Martinho quem mais perdeu, foi Sintra, o poder local e a
democracia. Não por medo do "outro", dos actuais dirigentes, das
freguesias vizinhas ou da perda de identidade, mas, sobretudo, por a voz do seu
povo ter sido abastardada e tratada como vã e inútil. Quem subestima o povo
tarde ou cedo lhe ficará às mãos (ou aos votos...).A saga continua, e por vezes
a História repete-se, quem sabe.
A União das Freguesias de Sintra
constitui uma idiossincrasia própria concentrando no seu vasto território uma
amostra do actual tecido sintrense, englobando a Sintra histórica e romântica,
a zona rural e alguns bairros marcadamente urbanos, onde a própria sede do
concelho se inclui.
Aos próximos autarcas compete
respeitar e dar voz ao sentir de 3 comunidades que, sendo contíguas, desenvolveram
contudo um forte espírito comunitário ao longo dos anos, pelo que ouvir e
decidir com parcimónia terá de estar sempre presente no comportamento dos
eleitos, reafirmando autonomia e capacidade reivindicativa perante a Câmara e
as entidades que nela se atravessam, buscando equidade e sustentabilidade nas
decisões, e assegurando a participação efectiva da comunidade nos assuntos que
lhe dizem respeito, sem preponderância de alguma das anteriores freguesias ou
seus problemas sobre as restantes.
Turismo, Agricultura, Cultura,
Serviços, a melhoria e reforço da Rede Social, são vectores determinantes no
caminho a seguir. Aqui deixo algumas sugestões que, enquanto cidadão e
munícipe, e também como dirigente associativo, me afiguram ser tarefas a desenvolver,
com os meios disponíveis ou partilhados:
-Dar um impulso determinante de ordem
política no sentido de requalificar e terminar o processo de reconversão de
algumas áreas urbanas de génese ilegal ainda existentes na nova freguesia.
-Melhorar de forma significativa a
limpeza de ruas e bermas, pressionando as empresas que operam na freguesia e
reforçando os meios próprios e a sua frequência. Combater de forma eficaz o
problema dos “monstros” anarquicamente lançados nas bermas, com sanções em
consonância.
-Utilizar de forma eficaz e útil os
diversos edifícios ora adstritos às anteriores juntas, aí alojando serviços
públicos, sociais ou culturais com impacto na vida das populações, e nos
sectores onde se mostre mais premente.
-Criar no âmbito da junta mais e
melhores serviços de apoio social, jurídico ou de apoio ao investimento, que,
por si ou em articulação com outras entidades possam agilizar procedimentos e
ser uma linha avançada na resposta aos fregueses e investidores.
-Equacionar quais os serviços que
devem continuar a ser executados pela junta e aqueles que possam ser pela
Câmara Municipal nesta delegados, sempre acompanhados do respectivo envelope
financeiro e recursos humanos, numa óptica de proximidade (a ligação com as
escolas do ensino básico, as associações culturais e desportivas ou as
associações de idosos, lares e centros de dia, por exemplo).
-Abrir um debate público em torno das
questões da mobilidade urbana, trânsito e transportes, no qual se questione a
manutenção do actual esquema de ruas pedonalizadas, a localização dos parques
de estacionamento e a sua natureza paga ou gratuita, ou a carência de
transportes públicos na freguesia depois das 21h.
-Procurar resposta para alguns casos
patológicos de degradação de património e da paisagem, como o Sintra-Cinema, o
Casal de S. Domingos ou a Quinta do Relógio, bem como diligenciar no sentido de
certas urbanizações já iniciadas não ficarem ao abandono, como parece estar a
ocorrer em Monte Santos.
-Providenciar espaço para as
actividades das associações e agentes culturais, desportivas e de
solidariedade, no regime jurídico que caso a caso se demonstre adequado,
segundo critérios de equidade, bem como apoiando a revitalização de inúmeras
sociedades recreativas, umas ao abandono, outras com défice de utilização.
-Participar activamente na revisão do
PDM, intervindo de forma veemente nas soluções que o novo Plano de Urbanização
de Sintra venha a considerar, bem como na articulação com a Parques de
Sintra-Monte da Lua, DGPC, Misericórdia e demais instituições na busca de
soluções de ordenamento do território e reabilitação urbana, onde a junta deve
reivindicar um lugar e voz activa.
-Estimular o Voluntariado e o Apoio
Social, tendo em conta a parcela relevante de idosos e cidadãos em risco de
exclusão social e a sua canalização para actividades socialmente úteis.
-Informatizar os serviços e o
atendimento, procurando que nenhum pedido formulado tenha resposta em prazo
superior a 5 dias, com a desmaterialização dos processos até ao ponto que a lei
em vigor o permita.
-Assegurar que as populações mais
isoladas ou com problemas de mobilidade tenham acesso regular e próximo a
serviços de farmácia, correios, multibanco, etc, com apoio directo ou recrutado
pela junta em coordenação com os demais actores da vida autárquica.
Estes alguns dos tópicos que, com 58
anos de vida em Sintra, 30 de técnico municipal e mais de 13 de dirigente
associativo na área da União das Freguesias de Sintra me parecem essenciais. E
sempre ouvindo os envolvidos, com espírito de quem venha para servir e não para
servir-se.
Do Barrunchal a Janas, de Lourel à
Vila Velha, da Portela a S. Pedro ou da Abrunheira a Cabriz, mais de 30.000
cidadãos esperam por melhoria de respostas. Que este seja também o tempo de
equacionar as perguntas, no quadro dum Poder Local activo e não reactivo, de
proximidade, diálogo e eficiência.
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