Com o cair do pano sobre as eleições autárquicas, é chegado o momento também do virar de página no quadro territorial, de competências e de gestão das autarquias, impondo-se um novo modelo, pois realidades há que exigem novas abordagens, pesem os bloqueios de paróquia que se não devem afirmar no quadro da representação institucional. No quadro da gestão, vê-se com bons olhos a criação de sistemas de gestão partilhada de serviços e pessoal, num quadro intermunicipal e regional, potenciando economia de meios e reforço de recursos. Porquê a proliferação de serviços de águas, lixo, cultura, proteção civil por cada município, quando num quadro integrado se poderão obter vantagens de gestão, força de reivindicação, e operacionalidade reforçada? O quadro deverá contudo ser complementado com a maleabilidade do outsourcing, a eliminação de serviços duplicados, derramas sobre as mais-valias a favor de obras ou ações de interesse comunitário e uma maior participação na fatia dos impostos nacionais. No quadro do planeamento, prioridade à reabilitação urbana, agilizando os planos de pormenor, reduzindo os pareceres de entidades sempre que haja plano diretor aprovado e dispensando prazos de apreciação quando os pedidos se ajustem a plano-tipo que a autarquia poderia disponibilizar. O recurso a empresas externas para a apreciação de projetos ou a manutenção de equipamentos num quadro de igualdade de oportunidades seria igualmente interessante, numa vertente de menos Estado e não só Estado diferente. Afigura-se correto que a gestão das áreas da educação, saúde, polícia municipal, cultura ou cobrança de impostos possa ser feita num âmbito intermunicipal, por exemplo, a que se acrescentem competências na área das zonas marítimas e portuárias, estacionamento, ou simplificação administrativa.
Como pontos
menos claros, nas propostas recentemente vindas a lume, a relação de forças
entre diversos níveis de poderes locais (freguesias, câmaras e as novas
entidades intermunicipais) misturando entidades emanadas do voto popular com
outras criadas pela lei e sem tal legitimação, e que na prática, dada a
panóplia de poderes que podem vir a ter em abstrato, podem configurar o cavalo
de Troia da Administração Central, sobretudo se ficar por esclarecer a forma de
financiamento e os recursos humanos e materiais a elas adstritos. Igualmente
por clarificar o papel futuro das CCDR.
O Governo
teve em consulta pública o projecto da nova lei quadro de transferência de
competências para as autarquias e entidades intermunicipais. Nota menos
positiva para a redação do nº 1 do artº 2º do projeto: “A transferência de
competências efetua-se para a autarquia local que, de acordo com a sua
natureza, se mostre mais adequada ao exercício da competência em causa”.
Afigura-se que esta cláusula aberta pode permitir tudo, mas também nada,
esperando que a legislação complementar prometida no artº 4º concretize mais
estas balizas.
Deverá vincar-se
a possibilidade de transferência da
gestão da rede de transportes terrestres de passageiros, que tanta
importância têm na solução de questões de mobilidade, e que no caso dum
município como Sintra, claramente marcado por uma lógica metropolitana, deverá
ser aprofundado.
Abandona-se uma
enumeração taxativa das atribuições e competências das autarquias para adotar
um sistema de cláusula geral, onde tudo podem ser atribuições em correlação com
o princípio da subsidiariedade. A baralhação pode vir a ser grande, contudo,
se, aplicada a possibilidade de delegação legal de competências das câmaras nas
freguesias, ou das câmaras nas entidades intermunicipais, ou até do governo
diretamente nestas, se vier a criar um quadro em que umas fiquem
sobrecarregadas e sem verbas, e outras vejam o controlo democrático pelos
eleitores subtraído por uma comunidade intermunicipal ou área metropolitana que
não foi objeto de sufrágio e tenderá a repercutir a vontade das maiorias
políticas nelas representadas, e não a dos eleitores ou órgãos dos municípios.
O projeto de
lei aparentemente reforça no papel as competências das freguesias, como
prometido na proposta de reorganização administrativa, mas sem ficar claro o
correspondente envelope financeiro, nem de quem partirá a iniciativa de contratualizar,
correndo-se o risco de duplicação de serviços e de funcionários adstritos às
mesmas funções.
Importante
se torna contudo a vontade de prossecução do desiderato do artº 6º da CRP na
concretização do princípio da subsidiariedade, da autonomia das autarquias
locais e da descentralização democrática da administração pública. Progresso,
Participação, Planeamento, eis os três P essenciais duma Politica Profícua e Patriótica.
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