Escreveu um dia Alain Peyrefitte que quando a China despertar, o mundo tremerá. Setenta anos depois da proclamação por Mao Tsé-Tung da Republica Popular da China, que hoje se assinalam, o gigante adormecido está cada vez mais acordado e presente no mundo globalizado, com expressão mais recente no novo projeto da Rota da Seda com que deseja afirmar uma dominação imperial, embora só fora de portas.
Até aqui
chegarmos, a uma China de capitalismo de Estado e afirmação tecnológica, houve
a anexação do Tibete, a luta contra o Kuomintang, 45 milhões de mortes entre
1958 e 1961, principalmente por causa da fome, e entre 1 e 2 milhões de
proprietários de terra executados sob a acusação de serem "contrarrevolucionários".
Nos anos sessenta, a Revolução Cultural, uma das maiores tragédias do século XX, afirmou um modelo comunista diverso do
soviético, que só se esbateria com a morte de Mao, em 1976, e a prisão do Bando
dos Quatro, feitos bodes expiatórios dos excessos desses anos de fanatismo.
Deng Xiaoping rapidamente arrebatou o poder ao sucessor de Mao, Hua Guofeng, e
embora nunca tenha sido chefe do partido ou do Estado, foi o "líder
supremo" de fato da China na época e a sua influência dentro do Partido
levou o país a importantes reformas económicas e à criação de pontes com o Ocidente, materializadas com a politica de "um país , dois sistemas", adotado a quando do regresso de Hong Kong e Macau à China. Posteriormente, o Partido
Comunista afrouxou o controle governamental sobre a vida dos cidadãos e as
comunas populares foram dissolvidas, sendo que muitos camponeses receberam arrendamentos de terras, aumentando os incentivos para a produção
agrícola. Estes eventos marcaram a transição da China de uma economia planificada para uma economia mista com um ambiente de mercado cada vez mais aberto, um
sistema chamado por alguns de socialismo de mercado e que o Partido Comunista
da China oficialmente descreveu como "socialismo com características chinesas", e que tem vindo a permitir que o Império do Meio seja hoje já dominante a nível mundial. Mas se a economia passou de
socialista a capitalista de Estado quase sem se dar por isso, a democracia não
acompanhou o fenómeno, com os eventos da Praça Tiananmen em 1989, a perseguição
aos dissidentes e a falta dum sistema democrático e plural o demonstraram.
Quando
passam setenta anos da gloriosa jornada rumo a um socialismo que nunca existiu,
falta à China a abertura à democracia, o respeito pelos direitos humanos e
sociais, baseados em trabalho escravo, o respeito pelo ambiente, marcado pela delapidação dos recursos naturais e a afirmação da força da repressão contra a força da razão, ante um mundo salivante e temeroso de afrontar esse mercado e fonte de financiamento muitas vezes obscuro e sem regras. Abertura económica e
política, é algo que tarda em despertar para lá das pedras da Grande Muralha.
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