Estar dentro e olhar para dentro.
Estar dentro e olhar para fora. Ser centro e periferia, emissor e recetor,
nesta fluída dialética de pulsões explode a escrita de Carlos M. Ferreira,
jovem de Fontanelas que no seu primeiro livro, Philoronia nos surpreende e delicia com textos eivados de lirismo,
introspecção em forma de recado, fé militante e um humor fino e simples,
assente na observação de um quotidiano cacofónico e disruptivo.
Nesta breve mas marcante viagem
interior nele surpreendemos o pássaro que deixa enfim o exílio e sobre nós
esvoaça, cavaleiro sem armadura mas dono do seu castelo, enfim alcançando o Parnasso.
De máscara em máscara, patrulheiro de sombras, ei-lo chegado à primeira paragem
da perturbante Viagem, para nela sair, lucidamente perdido no desfiladeiro
lúdico.
Desnudada a alma no papel-confessionário,
Carlos envia a palavra límpida e antes agrilhoada definitivamente ao seu
destino, qual origami dos sentidos e paleta de cores em desordem. Contudo, nada
atenuará o facto de que cada palavra nasce da tirania individual
entrincheirada nas verdades e nos mundos individuais, oniricos e febris. O
leitor pode nos seus textos descobrir mundos, estados de alma, intenções, divagantes emoções ou almas gémeas de mundos partilhados, mas só o autor, em
segredo, guardará o enigma da escrita, ortónimo de personagens várias. E é aí que reside o eterno e renovado fascínio da escrita e o mistério da leitura.
Dizia Schopenhauer que viver é
necessariamente sofrer. E escrever é libertar a coisa criada, e deixá-la partir
ao seu destino, capturado por leitores nem sempre atentos e turvados pelo
momentum do estado de espírito, atento e cúmplice, por vezes, distante e sem
partilha dum concreto pathos, por outro.
Carlos M. Ferreira revela-nos em toda
a sua trama as minudências dum ser aflito, mas, mais que aflito consigo mesmo,
aflito com este mundo de aflitos, escrevendo para se rebelar perante o Mundo
dos Homens, para no fim, nas entrelinhas, deixar no ar um auspicioso sinal de
esperança, por muito que todos os escritos estejam capturados por palpitantes
desabafos e reflexões, deixando transparecer a beleza de um ser humano atento e
altruísta. É uma viagem espiritual pelas cinzas do Homem, onde o Autor ensaia
reflectir sobre a dialéctica da positividade, qual obra de auto ajuda que no
final a todos ajuda, discernindo entre sorte e destino, destino com sorte ou
sem ela, no caminho da qual podemos criar o nosso próprio Deus, nas suas
palavras. Por vezes dá-se o peito às balas, outras as costas às facas, na
pulsão de jogos de sombras que projectam a gramática dos sentimentos e a
geografia das emoções. Terá existido quem não foi?- serenamente grita Carlos,
numa reflexão interrogativa e sentida. Rezar é dialogar. E no fim, lá estará ela,
finistérrica e atlante, qual por do sol de Fontanelas numa tarde de Verão,
aquilo que na Caverna do espírito todos almejam: a Luz.
Bem vindo à iniciática viagem pela Palavra.
Bem vindo à iniciática viagem pela Palavra.
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