Quase a cair o pano sobre um 2013 que não deixará saudades, a Cultura em 2014 ameaça repetir a anomia do ano que finda, sem
verbas e, sobretudo, com a crescente perda de massa crítica que a emigração de
arquitectos, bailarinos, músicos e outros origina e a luta titânica dos outros,
quase todos precários, ou em vias de precarização, esbracejando para garantir um prato de sopa
ou o pagamento da renda. Não há dinheiro, não há palhaços, diz um adágio
popular. Nem escritores, encenadores, livreiros, actores e muitos mais. Os
teatros de referência fecham, a nova lei do Cinema marca passo, os editores
fogem dos escritores sem nome feito, e a Cultura reduz-se a um alegado prato de
caviar num acampamento de refugiados.
A falta de soluções a ninguém
parece incomodar: o necrófilo e reformado Cavaco, acolhido em seu sarcófago, de
quando em quando sai da cripta para uns arrotos de economês, confessando
esgotar a sua intervenção nas conversas semanais com o delegado da tríade, o sr.
Coelho. Os políticos, falando para os acólitos, gritam baba e ranho pelos
telejornais, sem que um laivo de patriotismo os leve a sair da carapaça e
pensar em algo que não sejam tácticas partidárias. Dos militares com reumático,
sem munições ou blindados, pouco mais há a esperar que reivindicações
corporativas, e os sindicatos, arriscam-se um dia a não mais representar
trabalhadores, pois serão mais os desempregados que aqueles no activo.
Ululante, o povo definha e desiste, fugindo para geografias de esperança,
violentamente expulso da pátria, capturada por ciclopes e gárgulas. São vãs as
chamadas à unidade e a olhar mais longe que o umbigo, revelador da mesquinha
visão da classe política da aldeia, sem sopro de dignidade ou coragem, bastarda
filha do clientelismo larvar e da indigência cultural que brutalmente capturou
o país nos últimos anos.
Para uma situação de excepção,
hajam respostas excepcionais: é tempo do compromisso histórico das forças e
cidadãos que ponham o país primeiro, de líderes que peguem num caderno de
encargos de salvação nacional e reajam ao estado comatoso em que Portugal
sobrevive. O quadro actual está esgotado, e insistir no mesmo, é apressar o
abismo, e cometer o crime de ficar para a História como a geração da ruína.
Não se percebe como um país com
nove séculos se deixou aprisionar sem reação a uma moeda que lhe suga a
população, mina a economia, e onde se vive das promessas duma recuperação que
tarde ou jamais virá, tornando os sacrifícios actuais inúteis e as decisões
importantes sem eficácia real.
Precisamos de líderes que
devolvam a esperança, e para tanto há que construir soluções, dentro e fora do
tumefacto parlamento, onde meramente se discute o sexo dos anjos. Os políticos
incumbentes provaram não estar à altura da hora que passa, e muito menos os
europeus, o patético senhor Rompuy ou o sonolento Olli Rehn, burocratas sem
chama para quem Portugal não passa de um enfadonho relatório com números e sem
pessoas dentro.
Se assim não for, um longo e
tortuoso caminho de penúria e precariedade e a escuridão dum túnel sem fim
envolverão este país orfão, e o sopro de esperança que acalentou as gerações
que um dia viram a luz da liberdade definitivamente se apagará, para gáudio dos
profetas messiânicos e de muitos opinion
makers encartados. A turbulência não parece abrandar, e cedo ou tarde a
aeronave, comandada por loucos ensandecidos
poderá despenhar-se. Urge aterrar para reabastecimento, mudar a
tripulação e procurar porto seguro. Basta de Medo, e para encabeçar tal Exército
da Esperança há que contar com os agentes da Cultura, paladinos da Mudança,
feridos mas nem todos mortos, ainda.
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