sexta-feira, 3 de maio de 2013

O Verbo ameaçado pela Verba


Periga a democracia num regime onde a pobreza e miséria espreitam, e alastram de forma larvar. Num regime de pesos e contrapesos e numa sociedade aberta, a discussão e a discordância são dos mais elementares e salutares direitos, assim concorrendo para formar a opinião pública e influenciar os decisores. Mas, quando o Verbo é capturado pela Verba, ou falta dela, por muito que subsista de forma semântica o leque das liberdades, é a medo, e com medo, que a democracia prevalece, esmorecendo mesmo, capturada pelos adamastores da finança e títeres da política de submissão.
Quantos hoje calam a exigência dos mais elementares direitos por medo do desemprego, de não poder alimentar os filhos, ou pagar a prestação da casa? Quantos não desdenham já das virtudes da democracia, ou da eficácia do protesto, tornado banal e inconsequente? Quantos gritam e pregam no deserto, e, vencidos pelo cansaço, se alheiam, ou acabam por partir para horizontes onde se olhe a vida de frente, e não com os olhos no chão, vencidos da vida e espoliados da esperança?
A crise financeira, derivada da economia de casino e do desvario despesista, veio para ficar, como as pragas do Egipto, e ao matar a economia, mata a democracia, deixando à maioria a  convicção de que a mesma de nada serve senão como escape para destilar o fel da raiva e a impotência em potenciar mudanças. Chegaram assim as ditas sociedades da “abundância” ao fio da navalha, sem soluções confiáveis ou líderes de gabarito que permitam voltar a acreditar. Como ao cão de Pavlov, tarda a visão de um osso, para que o mesmo volte a ladrar, quedando-se  amorfo e triste na casota.
O medo que atravessa a sociedade, como nuvem purulenta e anestesiante, cedo ou tarde despertará fantasmas, incentivará ódios, reacções xenófobas, recriminações e clamor por culpados, que tirarão significado ao verdadeiramente significante nesta crise e farão alcandorar ao poder os profetas da desgraça ou manipuladores dos media que, com facilidade funcionam hoje como propulsores dos descamisados, na era da net e da morte das ideologias.

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