O povo espontaneamente pronunciou-se contra a crise e a
austeridade e os partidos do governo, em vez de se sentarem a reflectir na
resposta a dar à sociedade e a essa bofetada colectiva, comprazem-se em reunir
para taticismos e ver quem há-de descalçar a bota em que se enfiaram,
atribuindo-se culpas recíprocas e revelando a falta de coesão e sobretudo de
visão de um futuro com esperança de que o país está exangue.
Depois de 15 de Setembro, alterou-se a leitura e a
percepção de que a austeridade é inevitável e o povo a tudo se acomoda. As
pessoas olharam-se e descobriram aliados nas ruas onde antes passavam
cabisbaixas, forças na apatia resignada, e que uma luz redentora pode estar
para lá do túnel cavernoso onde nos enfiaram.
Neste quadro, é preciso que os partidos da situação não
façam orelhas moucas e oiçam a rua onde ainda civilizadamente se protesta,
escamoteando e relativizando a raiva para logo de seguida retomar os
rodriguinhos e verborreia parlamentar estafada e estéril. Ignorar os sinais é
meio caminho para a derrota e o pior que pode suceder será o autismo dos
partidos. De todos eles. Dos que governam, porque com estes sinais se
deslegitimam e perdem força, no país e lá fora. Dos que se opõe, pois um dia
chegará em que o protesto inconsequente fará com que o povo os veja como mais
do mesmo e como incapazes de construir uma alternância que seja também
alternativa.
A fadiga fiscal e a democracia semântica estão a matar a
essência da democracia e a crença nesta como o regime da ética e da
oportunidade, da coisa pública e do todos por todos. E isso pode conduzir a
novos e tortuosos caminhos, onde à pobreza e morte das classes médias se
seguirão salvadores populistas ou demagogos de verbo fácil. Portugal está de
novo em negação, e mais que uma mudança de política, há que refundar o regime,
reconduzindo-o à pureza dos princípios e à busca das metas iniciais. Nada será
como dantes depois deste 15 de Setembro, o 25 de Abril psicológico a partir do
qual tudo terá de ser repensado e a todos convoca, sobretudo as gerações mais
novas já nascidas na segurança do estado social e no culto do hedonismo
individualista, conseguido à custa dos país e avós e que serão sempre as
grandes vítimas dum Portugal capturado. É a hora!
Sem comentários:
Enviar um comentário