quinta-feira, 27 de julho de 2017

Galamares, uma breve história


Entre 6ª feira, 28 e 30, domingo, Galamares retoma a tradição das suas festas populares, com música, animação e gastronomia. No recinto da Escola Básica (acesso pela R. Verde Pinho, perto do restaurante Ares da Serra, à direita ou à esquerda conforme quem pela EN-247 venha de Sintra ou Colares) durante 3 dias passarão grupos recreativos como os afamados Top2, (sexta)Os Magos do Ritmo (sábado) ou o Conjunto de Eugénio Barra(domingo) para o serão musical. Oportunidade ainda para a actuação dos Camponeses de D.Maria (sábado, 16h) uma aula de zumba (sábado 18h), o desfile da Fanfarra dos Bombeiros Voluntários de Colares pelas ruas de Galamares (domingo 9h) pinturas faciais e jogos tradicionais (domingo, 15h30m) e a exibição da Banda da Sociedade Filarmónica dos Aliados (domingo, 18h).
HISTÓRIA DE GALAMARES
Galamares, na freguesia de S. Martinho, em Sintra, é um local onde o rural e o bucólico se cruzam e ao mesmo tempo onde estórias da História ocorreram.
Das páginas 149 a 151 da obra “CINTRA PINTURESCA-Memoria Descriptiva da Villa de Cintra, Collares e seus arredores” – 1838, do Visconde de Juromenha, consta uma “descripção da villa de Collares” de há 170 anos atrás. Nela faz-se referência a “Gallamares”, supostamente vocábulo corrupto de “Alaga-Mares” por chegar antigamente a maré àquele sítio, inundando-se, na enchente, o vale por ela percorrido. O autor faz referência à perda de navegabilidade do rio Colares, tendo-se tornado o seu leito, no estio, “vadiavel em toda a parte” (percorrível a pé?). Dever-se-á, segundo o Visconde, a duas causas concorrentes: (i) o progressivo assoreamento da foz, antigamente “limpa e funda“, por onde acediam as embarcações que demandavam o porto de Colares, (ii) e as retiradas de água da ribeira para a rega dos pomares. É ainda referido que, já no ano de 1154, no foral de Cintra, se designava este rio por “Galamar” e que os nomes de alguns sítios em redor do mesmo rio de Collares, designados Porto, Reconcavo, Terra Firme, Auguaria, etc. de alguma forma fundamentam “a conjectura tradiccional de o mar ter occupado estes campos e areaes, a que ainda chamão marinhas, que hoje se veem aproveitados em vinhas e pinhaes”
Pouco povoada, como os inquéritos mandados fazer em 1758 pelo Marquês de Pombal o deixam antever-pouco mais de 40 “vizinhos”, surge no século XIX associada à primeira viagem de balão que se realizou em Portugal, e que vem descrita na Gazeta de Lisboa de 21 de Março de 1819.
Com o advento do romantismo, veio a moda da vilegiatura. Irene Lisboa foi mais uma das figuras que elegeu esta terra como local de vilegiatura, terra que os médicos recomendavam como bons para doenças de pulmões. Nos anos 40 inclusive chegaram a funcionar sete pensões numa terra de pouco mais de 300 habitantes- à época.
Falar de Galamares nos últimos 50 anos é falar da esplanada do Alcino, as Caves de S. Martinho, inauguradas em 1949,e que durante décadas funcionou como pensão, restaurante e café. Muitos veraneantes dos anos sessenta e setenta,ali assistiram ás tertúlias nocturnas de Agosto quando as famílias da capital vinham a banhos, e alugavam toldo ao mês na Praia das Maçãs, e se vestiam para ir á noite ao café, local de encontro social onde chegou a haver uma jukebox, se admiraram os shows de ilusionismo do Xaimix ,e se chegou a pagar para assistir aos jogos do Mundial de Inglaterra, em 66.
Galamares como terra de vilegiatura e de casas esparsas, nasceu como núcleo urbano mais vincado -se bem que irregular- já no início do século XX, a partir da expansão populacional motivada sobretudo pela fixação de famílias que de alguma forma trabalharam para o Visconde de Monserrate e que pela zona da Sanfanha, e depois mais junto á Estrada Nacional nº247 se estabeleceram.
Deve-se ao Visconde de Monserrate o Salão de Galamares, bem como a água cedida através de chafariz público desde 1905.Após a sua morte, e com a dispersão e venda do património e palácio nos anos 40,muito da primitiva propriedade foi desmembrado, tendo ficado como um dos principais proprietários o seu administrador, Guilherme Oram, que por seu turno foi vendendo e destacando parcelas, que se estendiam da Ponte Redonda ao Pinhal das Cavalhadas, e onde, sobretudo a partir dos anos 40 surgiram casas burguesas de veraneio, muito procuradas para se apanharem os “ares ” da serra, a conselho médico, resultantes de vendas efectuadas (um terreno nos anos 40 custava a módica quantia de 15 contos!).
Entre os veraneantes famosos contaram-se Barahona Fernandes, professor e percursor da psiquiatria em Portugal, reitor da Universidade de Lisboa entre 1974 e 1977;Alfredo Guisado, escritor, companheiro de Pessoa e Almada e director nos anos 30 do jornal República; José Gomes Ferreira, escritor, com poemas escritos nas Caves de S. Martinho, que se podem ler nomeadamente no seu livro Poeta Militante; Reinaldo dos Santos, médico eminente; João Medina, professor catedrático da Faculdade de Letras; o radialista Ferreira da Costa, que cobriu as guerras coloniais em África; Maria Eugénia Cunhal, irmã de Álvaro Cunhal,etc.
Outra presença frequenta era o escritor e ensaísta Mário Dionísio. No espólio de Mário Dionísio há fotografias e textos datados que falam do paraíso que era para ele Galamares: entre 1953 e 1957,quando andava às voltas com a «A Paleta e Mundo», obra em fascículos, cujo primeiro volume acabou de ser publicado em 1956, e o segundo volume em 1962.Mário Dionísio tinha alugado uma casa «ao ano», como se dizia, a casinha então isolada do Sr. José da Quinta, que vivia nas traseiras, ao fundo de uma estrada escalavrada que ia da linha do eléctrico lá para cima, na curva onde se vendiam as belas «nozes douradas de Galamares»…
Começou por ficar na Pensão Mariana, o «ferro eléctrico», que era mais barata do que as «Caves de S. Martinho» mais conhecidas por «café do Sr. Alcino», onde foi em tempos a sede da Alagamares. Havia então também a Pensão Maria Duarte e a Pensão Moderna.
Os amigos lá passavam férias ou os iam visitar: Ferreira de Castro, Alfredo Guisado e família,etc.
Existe em Galamares um cine-teatro datado do princípio do século, onde durante anos, mercê da generosidade do visconde de Monserrate se realizaram récitas musicais, teatro amador, cinema, etc, num espaço romântico de fim de século, com balcão e plateia, decorado com pinturas murais e baixos relevos.
O restauro deste espaço foi importante. Trata-se do único espaço público de Galamares, ali tocou Viana da Mota em 1923,e se fez teatro nos anos 40 a 60.O desporto, mormente o ciclismo e atletismo teve igualmente algum destaque.
Em Galamares igualmente funcionou durante anos a Casa das Nozes, das nozes douradas, doce típico hoje quase desaparecido. Há que preservar tal tradição! Porque embora más para o colesterol, a memória também passa pelo estômago. E se Sintra tem as queijadas e travesseiros e Belas os fofos, Galamares tem as suas nozes. Quem pega na receita e a continua?
 A partir dos anos 80 o fenómeno da casa de campo foi-se diluindo e muitos ou se fixaram de vez, bem como seus descendentes, ou venderam as casas, tornando a terra, hoje com 1300 habitantes, mais habitada durante todo o ano, com uma população herdeira dos antigos veraneantes ou dos antigos rendeiros e caseiros que por cá ficaram. Hoje como ontem, á sombra da silhueta de Mil e Uma Noites de Monserrate se vai mantendo o Éden ao pé da Aldeia Grande. Que se mantenha por muitos anos!

quarta-feira, 26 de julho de 2017

Os dias da pós-verdade




Vivemos no tempo da pós-verdade e dos factos alternativos.

Não morreram 64 pessoas em Pedrogão, estava em segredo de Justiça, só agora quando o Ministério Público o confirmou é que sim, morreram então, os funerais e lágrimas derramados podem ser oficiais e as homenagens legitimadas.

Os banqueiros são todos honestos e tudo corria bem, até que, vejam lá, um malfadado governador do Banco de Portugal tirou o tapete a quem zelosamente pugnava pelas nossas PME e pela retoma da economia nacional.

As armas de Tancos eram obsoletas e não valiam mais de 34.000 euros, mas a NATO, a CIA, a Mossad e o Daesh ficaram logo de sobreaviso com umas fisgas e uns bacamartes do tempo da guerra do Solnado que afinal, até se agradece terem levado, poupando no pessoal das mudanças.

Vários secretários de Estado, lampeiros, foram até Paris à pala do gás, mas, invejosos, nenhum mal veio ao mundo, trabalho é trabalho, conhaque é conhaque, e conhaque no meio do trabalho ajuda a fazer a digestão.

A verdade a cada qual: para um terrorista, uma explosão em Paris é uma boa notícia, para um cidadão uma má; para um benfiquista uma vitória do Sporting é uma não-verdade, e o contrário é igual. Para a oposição, todo o Governo é mau só por ser governo, todas as boas notícias são fabricadas e todas as más ficam aquém.

Hoje, com a imprensa cada vez mais dirigida por grupos económicos que a usam como arma de negociação, o infotainment e o jornalismo abutre, as redes sociais infestadas de inverdades e o maniqueísmo paranoico a tomar conta do espaço mediático, já não se pergunta ou afirma o que é, mas cada vez mais aquilo que se quer que seja. A verdade? Ora, coisa para puritanos botas de elástico.

 

 

sexta-feira, 21 de julho de 2017

Azenhas do Mar, um presépio com sabor a sal


Finistérrica falésia junto à mata atlântica, as Azenhas do Mar são um presépio branco com cheiro a pinho e sabor a sal, com a serra de Sintra vigiando as disciplinadas águas migrando para o Grande Oceano, polvilhado por alvas casas debruadas a azul, e adornado promontório de urze e pinho patrulhado por corvos e gaivotas rasgando os céus desafiadores.
Encavalitada nas rochas, outrora terra de rainhas, muitas a procuraram no passado, com destaque para a festejada visita de D. Luísa de Gusmão em Julho de 1652, ou as estadias de Maria Pia e D. Amélia em tempos mais recentes. De S. Lourenço é devota, como o atesta a singela capela, cuja galilé destruída em 1966 foi restaurada em 1995, anualmente celebrado nas festas do mês de Agosto, a celebrar a fé de pescadores e das gentes do campo, desse campo de chão quente e arenoso onde desde tempos imemoriais emerge o ramisco, talhado pelas mãos generosas e sábias de homens bons abrindo covas, trabalhando o vime e no seu chão argiloso depositando as cepas e bacelos donde frutificará o néctar que aquecerá a alma e saciará a sede.
Se o casario se perde na noite dos tempos, é no século XX que as Azenhas do Mar surgem como postal dum Portugal suave e laborioso lavrando os campos, partindo para a pesca ou tratando as vinhas. No princípio do século, em 1920, ali constrói Raul Lino a sua famosa Casa Branca ou do Marco, exemplar singular duma arquitectura despojada em diálogo com a natureza, feita de silêncios e sensações, sem água nem luz eléctrica. E é decorrente do trabalho da Comissão de Melhoramentos das Azenhas do Mar que em Agosto de 1927 se inicia a construção da emblemática escola primária, projecto de Amílcar Pinto, Jorge Segurado e Frederico Carvalho apadrinhado pelo então ministro da Instrução Pública Alfredo de Magalhães e inaugurada dez meses depois, em Junho de 1928 pelo presidente Carmona. É um período áureo das Azenhas do Mar, impulsionado por figuras como Emílio Paula Campos, aguarelista e escultor, ali residente desde 1910, e um dos entusiastas da construção da piscina oceânica, da escola, ou da estrada para Janas, e em cuja casa se alojou Leal da Câmara ou um ainda jovem Júlio Pomar, casa da qual fez um museu que funcionou entre 1945 e 1970, e cujo espólio está hoje a salvo, também por acção de seu sobrinho e grande figura das Azenhas, recentemente desaparecido, o arquitecto Francisco Castro Rodrigues.
É desse período o filme de Artur da Costa Macedo “A Praia das Maçãs e as Azenhas do Mar”, estreado no cinema Condes em 28 de Agosto de 1928, bem como a  abertura duma carreira de autocarros da Auto Sintrense em Março de 1930, e a extensão do eléctrico da Praia das Maçãs até às Azenhas nesse mesmo período, facto celebrado de forma insólita. Sendo voz do povo que o eléctrico só chegaria às Azenhas quando o chafariz deitasse vinho em vez de água, do chafariz de Vila Chã, construído em 1893 por influência de Luís Colares, inaugurado em 1894 e remodelado por Paula Campos em 1928, mais conhecido pelo Arcão, promoveu o grande filantropo Alberto Totta, mesário da santa Casa e um dos fundadores da Adega Regional de Colares, a canalização através do dito chafariz de barris de vinho de que milagrosamente todo o povo se saciou, havendo mesmo o relato de um tal Jacinto que terá emborcado nada menos que vinte e oito copos… 
Regista-se igualmente em Maio de 1945 a fundação da Orquestra Beira Mar, num período pujante de vilegiatura burguesa impulsionada pela propaganda do Estado Novo e pela propagação dos chalés português suave duma burguesia a banhos, dispersa entre Sintra e os Estoris.
As Azenhas do Mar são terra de vinho e de néctares. Em 1848 Luís Augusto e Manuel José Colares fundaram a Adega Beira-Mar e em 1899 João, António e Hermenegildo Bernardino da Silva a adega Chitas, produtora do Collares Chitas, e desde 1900 do afamado Beira-Mar.

Dos 22 fogos registados em 1815 até hoje, as Azenhas, felizmente, pouco cresceram, alvas testemunhas do labor dos Homens e do poder do Mar. Registada na Conta-Corrente de Vergílio Ferreira ou na Viagem a Portugal de Saramago, incensada por viajantes que nela vêm uma Santorini do Atlântico, será de toda a justiça que lhe seja atribuído mais um galardão público nestes tempos de afã mediático, cientes de que as ondas continuarão a fustigar a rocha, o sol continuará a brilhar sobre o casario e na noite dos tempos o promontório altivamente guardará este seu ninho.

quarta-feira, 19 de julho de 2017

7 Maravilhas de Portugal: Vote Azenhas do Mar!

 
  
Azenhas do Mar é uma aldeia do litoral sintrense com 451 habitantes e uma das 7 finalistas na categoria aldeias de mar do Concurso 7 Maravilhas de Portugal, cuja final decorrerá dia 3 de Setembro.
Aqui veio a rainha D. Luísa de Gusmão, passaram férias o rei D. Carlos I e as rainhas D. Amélia e D. Maria Pia. Muitos arquitetos do século XX aqui implantaram as suas criações, como Raul Lino, Norte Júnior e outros, sobre ela escreveram Vergílio Ferreira ou José Saramago.
Lugar inspirador para pintores como Emílio Paula Campos, Júlio Pomar, Alfredo Keil e tantos outros, foi ainda estância dilecta de cineastas como Perdigão Queiroga, Beatriz Costa ou Carmen Dolores.
A sua Capela de São Lourenço data dos finais do séc. XVI e está integralmente restaurada. A Escola, construída em 1927, e inaugurada pelo Presidente Óscar Carmona, serviu de modelo para a filosofia dos edifícios escolares do Estado Novo.
A História imensa das Azenhas do Mar, aliada à sua beleza natural, com o casario a descer em cascata falésia até ao oceano, confere-lhe um cenário de “belo terrível”, tão ao sabor do gosto romântico.
 No dia 23 de Julho, dia da gala que terá lugar nas Azenhas do Mar a partir das 21h, vote nas Azenhas do Mar logo a partir das 11h da manhã. A votação é por chamada telefónica e o número para votar é facultado no início das galas.Vote quantas vezes lhe apetecer para sermos a aldeia mais votada e marcarmos presença na final, no dia 3 de Setembro.

terça-feira, 18 de julho de 2017

Reflectindo sobre a minha freguesia em ano eleitoral- I

A proximidade das eleições autárquicas leva-me a pensar na extinção da histórica freguesia de S. Martinho, em Sintra, onde resido, trabalho e cuja história já registei em livro em parceria com Daniel André.

A extinção da freguesia, por agregação com Santa Maria e S. Miguel e S. Pedro de Penaferrim, centralizando a sede da nova União das Freguesias de Sintra em Santa Maria e S. Miguel, constituiu um acto impensado e atentatório da vontade dos seus fregueses, que, no mínimo, deveria merecer a consideração de uma justificação adequada, decorrente de estudos sérios e participados que levassem a essa conclusão, e que fosse objecto de auscultação da população, pela pronúncia favorável dos seus órgãos próprios ou pela convocação de um referendo local. Deveria ser assim, nas democracias. Nesta não. Até porque não foi dada a oportunidade de exercer o contraditório, por audiência aos interessados, apenas tendo havido pronúncia das assembleias de freguesia pela não extinção ou agregação em abstracto. Coisas que um tal Relvas em dias da troika teceu.

S.Martinho, da Vila a Janas e de Galamares a Nafarros, construiu uma identidade ao longo de décadas em torno das suas festas, símbolos, colectividades e património. A ela se dedicaram autarcas como Noel Cunha, Álvaro Ramires, João Pedro Miranda, Adriano Filipe ou Fernando Pereira, nela se situam várias das instituições emblemáticas de Sintra. Com os anos, foi das poucas freguesias que viu a população crescer, ampliou e modernizou instalações e serviços e dinamizou a acção social, pelo que o mínimo exigível seria o reconhecimento do trabalho feito por autarcas de várias cores mas com uma só camisola. Com a agregação, que muitos contestaram mas hoje já esqueceram, não foi S.Martinho quem mais perdeu, foi Sintra, o poder local e a democracia. Não por medo do "outro", dos actuais dirigentes, das freguesias vizinhas ou da perda de identidade, mas, sobretudo, por a voz do seu povo ter sido abastardada e tratada como vã e inútil. Quem subestima o povo tarde ou cedo lhe ficará às mãos (ou aos votos...).A saga continua, e por vezes a História repete-se, quem sabe.

A União das Freguesias de Sintra constitui uma idiossincrasia própria concentrando no seu vasto território uma amostra do actual tecido sintrense, englobando a Sintra histórica e romântica, a zona rural e alguns bairros marcadamente urbanos, onde a própria sede do concelho se inclui.

Aos próximos autarcas compete respeitar e dar voz ao sentir de 3 comunidades que, sendo contíguas, desenvolveram contudo um forte espírito comunitário ao longo dos anos, pelo que ouvir e decidir com parcimónia terá de estar sempre presente no comportamento dos eleitos, reafirmando autonomia e capacidade reivindicativa perante a Câmara e as entidades que nela se atravessam, buscando equidade e sustentabilidade nas decisões, e assegurando a participação efectiva da comunidade nos assuntos que lhe dizem respeito, sem preponderância de alguma das anteriores freguesias ou seus problemas sobre as restantes.

Turismo, Agricultura, Cultura, Serviços, a melhoria e reforço da Rede Social, são vectores determinantes no caminho a seguir. Aqui deixo algumas sugestões que, enquanto cidadão e munícipe, e também como dirigente associativo, me afiguram ser tarefas a desenvolver, com os meios disponíveis ou partilhados:

-Dar um impulso determinante de ordem política no sentido de requalificar e terminar o processo de reconversão de algumas áreas urbanas de génese ilegal ainda existentes na nova freguesia.

-Melhorar de forma significativa a limpeza de ruas e bermas, pressionando as empresas que operam na freguesia e reforçando os meios próprios e a sua frequência. Combater de forma eficaz o problema dos “monstros” anarquicamente lançados nas bermas, com sanções em consonância.

-Utilizar de forma eficaz e útil os diversos edifícios ora adstritos às anteriores juntas, aí alojando serviços públicos, sociais ou culturais com impacto na vida das populações, e nos sectores onde se mostre mais premente.

-Criar no âmbito da junta mais e melhores serviços de apoio social, jurídico ou de apoio ao investimento, que, por si ou em articulação com outras entidades possam agilizar procedimentos e ser uma linha avançada na resposta aos fregueses e investidores.

-Equacionar quais os serviços que devem continuar a ser executados pela junta e aqueles que possam ser pela Câmara Municipal nesta delegados, sempre acompanhados do respectivo envelope financeiro e recursos humanos, numa óptica de proximidade (a ligação com as escolas do ensino básico, as associações culturais e desportivas ou as associações de idosos, lares e centros de dia, por exemplo).

-Abrir um debate público em torno das questões da mobilidade urbana, trânsito e transportes, no qual se questione a manutenção do actual esquema de ruas pedonalizadas, a localização dos parques de estacionamento e a sua natureza paga ou gratuita, ou a carência de transportes públicos na freguesia depois das 21h.

-Procurar resposta para alguns casos patológicos de degradação de património e da paisagem, como o Sintra-Cinema, o Casal de S. Domingos ou a Quinta do Relógio, bem como diligenciar no sentido de certas urbanizações já iniciadas não ficarem ao abandono, como parece estar a ocorrer em Monte Santos.

-Providenciar espaço para as actividades das associações e agentes culturais, desportivas e de solidariedade, no regime jurídico que caso a caso se demonstre adequado, segundo critérios de equidade, bem como apoiando a revitalização de inúmeras sociedades recreativas, umas ao abandono, outras com défice de utilização.

-Participar activamente na revisão do PDM, intervindo de forma veemente nas soluções que o novo Plano de Urbanização de Sintra venha a considerar, bem como na articulação com a Parques de Sintra-Monte da Lua, DGPC, Misericórdia e demais instituições na busca de soluções de ordenamento do território e reabilitação urbana, onde a junta deve reivindicar um lugar e voz activa.

-Estimular o Voluntariado e o Apoio Social, tendo em conta a parcela relevante de idosos e cidadãos em risco de exclusão social e a sua canalização para actividades socialmente úteis.
-Informatizar os serviços e o atendimento, procurando que nenhum pedido formulado tenha resposta em prazo superior a 5 dias, com a desmaterialização dos processos até ao ponto que a lei em vigor o permita.

-Assegurar que as populações mais isoladas ou com problemas de mobilidade tenham acesso regular e próximo a serviços de farmácia, correios, multibanco, etc, com apoio directo ou recrutado pela junta em coordenação com os demais actores da vida autárquica.

Estes alguns dos tópicos que, com 58 anos de vida em Sintra, 30 de técnico municipal e mais de 13 de dirigente associativo na área da União das Freguesias de Sintra me parecem essenciais. E sempre ouvindo os envolvidos, com espírito de quem venha para servir e não para servir-se.


Do Barrunchal a Janas, de Lourel à Vila Velha, da Portela a S. Pedro ou da Abrunheira a Cabriz, mais de 30.000 cidadãos esperam por melhoria de respostas. Que este seja também o tempo de equacionar as perguntas, no quadro dum Poder Local activo e não reactivo, de proximidade, diálogo e eficiência.

domingo, 9 de julho de 2017

Philoronia ou a viagem dum jovem atlante


Estar dentro e olhar para dentro. Estar dentro e olhar para fora. Ser centro e periferia, emissor e recetor, nesta fluída dialética de pulsões explode a escrita de Carlos M. Ferreira, jovem de Fontanelas que no seu primeiro livro, Philoronia nos surpreende e delicia com textos eivados de lirismo, introspecção em forma de recado, fé militante e um humor fino e simples, assente na observação de um quotidiano cacofónico e disruptivo.
Nesta breve mas marcante viagem interior nele surpreendemos o pássaro que deixa enfim o exílio e sobre nós esvoaça, cavaleiro sem armadura mas dono do seu castelo, enfim alcançando o Parnasso. De máscara em máscara, patrulheiro de sombras, ei-lo chegado à primeira paragem da perturbante Viagem, para nela sair, lucidamente perdido no desfiladeiro lúdico.
Desnudada a alma no papel-confessionário, Carlos envia a palavra límpida e antes agrilhoada definitivamente ao seu destino, qual origami dos sentidos e paleta de cores em desordem. Contudo, nada atenuará o facto de que cada palavra nasce da tirania individual entrincheirada nas verdades e nos mundos individuais, oniricos e febris. O leitor pode nos seus textos descobrir mundos, estados de alma, intenções, divagantes emoções ou almas gémeas de mundos partilhados, mas só o autor, em segredo, guardará o enigma da escrita, ortónimo de personagens várias. E é aí que reside o eterno e renovado fascínio da escrita e o mistério da leitura.
Dizia Schopenhauer que viver é necessariamente sofrer. E escrever é libertar a coisa criada, e deixá-la partir ao seu destino, capturado por leitores nem sempre atentos e turvados pelo momentum do estado de espírito, atento e cúmplice, por vezes, distante e sem partilha dum concreto pathos, por outro.
Carlos M. Ferreira revela-nos em toda a sua trama as minudências dum ser aflito, mas, mais que aflito consigo mesmo, aflito com este mundo de aflitos, escrevendo para se rebelar perante o Mundo dos Homens, para no fim, nas entrelinhas, deixar no ar um auspicioso sinal de esperança, por muito que todos os escritos estejam capturados por palpitantes desabafos e reflexões, deixando transparecer a beleza de um ser humano atento e altruísta. É uma viagem espiritual pelas cinzas do Homem, onde o Autor ensaia reflectir sobre a dialéctica da positividade, qual obra de auto ajuda que no final a todos ajuda, discernindo entre sorte e destino, destino com sorte ou sem ela, no caminho da qual podemos criar o nosso próprio Deus, nas suas palavras. Por vezes dá-se o peito às balas, outras as costas às facas, na pulsão de jogos de sombras que projectam a gramática dos sentimentos e a geografia das emoções. Terá existido quem não foi?- serenamente grita Carlos, numa reflexão interrogativa e sentida. Rezar é dialogar. E no fim, lá estará ela, finistérrica e atlante, qual por do sol de Fontanelas numa tarde de Verão, aquilo que na Caverna do espírito todos almejam: a Luz.
Bem vindo à iniciática viagem pela Palavra.