É com prazer e consideração que reproduzo a crítica que o escritor e ensaísta Miguel Real fez do meu livro "Histórias Com Sintra Dentro"
FERNANDO MORAIS
GOMES
O ROMANCE DE
SINTRA
Histórias
com Sintra Dentro
(2015), livro singular de Fernando Morais Gomes, acabado de ser publicado, bem
poderia ser designado por “o romance de Sintra”.
Fruto de uma poderosa imaginação,
harmonizando o pormenor mais ínfimo com as múltiplas visões gerais sobre Sintra
(Romantismo, Misticismo, Sintra Templária, Sintra Medieval, Sintra Turística…),
tomando como base os inúmeros factos e as inúmeras lendas sobre a Vila,
Fernando Morais Gomes escreveu um brilhante livro de contos/crónicas ou
crónicas/contos sobre o tema que como presidente da Associação Alagamares há
muito o preocupa e lhe move dos dias como uma espécie de “guardião cultural” do
concelho.
Dividido em duas partes, “Viagem
Espectral” e “Café com Adoçante”, Histórias
com Sintra Dentro reparte-se entre a historiografia ficcional do concelho
(I Parte) e a narração de pequenas histórias actuais (II Parte).
Deste modo, o autor inicia o livro com
um relato sobre a cosmologia mítica de Sintra, celebrando a aliança entre os
moradores (os Terráqueos) e a Serra, bem como as relações entre o panteão dos
deuses gregos, Ulisses e um filho deste que teria aportado a um “alagamar”,
junto ao rio das Maçãs. Do mesmo modo, relata as antigas invasões nórdicas que
teriam assolado “Xintara” e Colares. A crónica/conto “Alla u akbar!” introduz o
reino mouro em Sintra e, de imediato, a sua conquista por D. Afonso Henriques.
E assim o livro continua, atravessando
os momentos mais importantes da história da Vila, até se findar já este século,
em 2011, com a narração de uma estória exemplar sobre o abate indiscriminado de
árvores. Pelo meio, ficam 190 pp. com numerosas narrativas, algumas factuais,
outras ficcionais, outras, ainda, biográficas relativas às mais importantes figuras
que fixam para todo o sempre a História de Sintra.
Não se tratou de reunir provas
documentais nem de consultar espólios ou registos de fidelidade absoluta ao
passado segundo o método historiográfico alexandreherculiano, mas de, com base
nestes, na experiência pessoal do autor na sua infância e adolescência em
Galamares/Colares e seguindo o relato popular de lendas, estórias, contos,
mitos – e certamente o resultado de inúmeras leituras consultadas nas
bibliotecas do concelho - de reunir num volume único o grande espólio da
tradição histórica de Sintra.
Trata-se, portanto, de juntar num só
texto a cultura árabe remanescente nos saloios e o impulso romântico da
Condessa de Edla e D. Fernando II, de ligar a visão musical erudita de Olga
Cadaval e as histórias dos poetas e contadores populares sobre fantasmas e
espectros da Serra, de reunir a visão da caravela regressada da viagem marítima
para a Índia presenciada por D. Manuel na Peninha às aventuras trágicas de D.
Sebastião, de agrupar o segredo dos Templários às investigações
histórico-míticas de João Rodil, de associar o alto egotismo narcisíaco de M.
S. Lourenço às tertúlias contestatárias de Mário Dionísio e José Gomes Ferreira
na década de 1950, das intrigas populares entre terras e entre vizinhos à
eterna rivalidade entre Sintra e Lisboa, da instauração da República em Sintra
às desgraças da I Guerra Mundial registadas em pedra na Correnteza…
Têm agora os sintrenses à sua disposição
o elenco deste longo repositório cultural de 800 anos que é a história de
Sintra. Basta consultar o livro e segui-lo página a página e, se formos
vocacionados para a ficção, lê-lo com prazer; se formos vocacionados para a
História, extrair de cada conto/crónica o sumo histórico.
Inspirado no realismo histórico (há sempre
um fundo real, ainda que lendário, ou a experiência pessoal do autor para os
tempos mais recentes em todos os contos/crónicas) e dotado de um estilo
sintacticamente flexível, compondo frases longas, Fernando Morais Gomes utiliza
um léxico ora popular, ora psicológico (baseado no conhecimento empírico dos
homens), ora erudito, um vocabulário ora concreto (algumas estórias podem ser
lidas por ou para crianças), ora abstracto, Histórias
com Sintra Dentro merece ocupar um lugar especial nas bibliotecas do concelho
e nas pastas dos professores como material de apoio às aulas sobre a longa
história da nossa vila e concelho.
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