Cidadão do mundo, e frequente retirante em Sintra, Luís
Filipe Sarmento é um escritor do Prazer e por prazer, espelhando os nossos dias
sem umbiguismo diletante mas onde o Espelho está sub-repticiamente presente.
Destaque para o seu recente livro Como um Mau Filme Americano, onde
o jogo de sedução entre um pintor americano de meia idade e uma jovem com
trinta anos menos é o ponto de partida para um jogo que Pirandello não
desdenharia, e onde autor, narrador e personagens são avatares de estados de
alma, quiçá o de um deles, ou, quem sabe, de nenhum.
A arte, a liberdade, o prazer, tudo se joga numa história
onde o kitch roça o sublime num desfiladeiro de incertezas e verdades tudo
menos absolutas, e onde tudo se sucede como se o computador fosse um ecrã onde
do lado de lá os personagens fluem e por vezes se rebelam contra o rumo do autor
e dum alter ego maniqueísta chamado
narrador, manobrando o que poderia ser o enredo de um mau filme americano mas
também um excelente filme de tradição francesa.
Ao longo da história vêm à memória Marlene Dietrich e o seu
Anjo Azul, Rotko e as suas inseguranças, Henry Miller e Annais Nin, Woody
Allen, sempre, um espaço contaminado por lugares comuns que desembocam em
surpresas constantes, tal como o fim, igualmente surpreendente.
Um livro de cor anil, como anil é o período artístico do
personagem, a que não falta, provocatória, a cena recorrente duma ex-mulher
enciumada( há sempre uma ex-mulher, e não precisa de ser um filme americano…) e
a masturbativa trama da construção dum novo quadro, o da materialização do
prazer, no fundo, a sagração do fetiche. Um livro a ler dum autor enredado numa gramática dos sentidos.
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