quarta-feira, 10 de outubro de 2012

As casas fantasma


A mais valia de morar em Sintra, nos anos 80 e 90, dadas as acessibilidades (IC19 e comboio),  os equipamentos, e a proximidade do mar, serra e cidade, originou um boom na construção civil responsável por uma considerável expansão populacional, que acarretou igualmente problemas novos de integração, mobilidade e multiculturalidade.
Com o planeamento urbano a chegar atrasado em relação à dinâmica económica impulsionada pelos patos bravos, e na perspectiva de lucros, taxas e impostos fáceis, município, banca e construtores, acertaram um pacto tácito que fez da betonizada Sintra o 2º concelho do país, com assimetrias e particularidades divididas entre a zona rural, bucólica e turística, e a conurbação indistinta de habitações colectivas, que o crédito barato e a procura emergente, logo transformou em cidades satélite, e parte delas em freguesias.
Sustida a ocidente pelo “cinto verde” do velhinho Plano de Groer, de 1949, e posteriormente pelo Plano de Ordenamento do Parque Natural Sintra-Cascais, e o POOC Sintra-Sado, Sintra “cresceu” para leste ,como muitos dos jovens rebeldes que nela pululam, em bairros disformes e atípicos: sem rumo ou apoio, nas margens da delinquência urbanística, com anomia social e num explosivo caldeirão de subculturas ditas urbanas, que olham o espaço como inimigo e a convivialidade com cultura de gangue, desprezando o espaço público, marcado pelo lixo acumulado, os grafittis sem nexo, a violência nos transportes, e o bullying nas escolas.
Feito o mal, há que procurar o (possível) remédio. E há também que procurar mitigar novos problemas, atento o facto de ainda persistir um quadro de 15000 fogos por vender ou arrendar, apanhados no olho do furacão da crise, em clara homenagem à ganância e falta de planeamento, e de um vasto número de habitações estar a ser abandonada por falta de pagamento aos bancos ou emigração dos seus moradores. A realidade social está a mudar, e infelizmente, para pior, desfeito que foi o sonho de classe média dos T3 com lareira,  e dos parques urbanos com ciclovias e crianças felizes.
É preciso que as entidades públicas olhem a gestão do espaço público em atenção a estas dinâmicas sociais, procurando intervir no arrendamento desses fogos fechados e de venda difícil, adquirindo-os, ou contratualizando-os com a banca ou os promotores, de modo a responder a novas necessidades, que, presentemente, são geradoras de alarme social, fazendo da crise uma oportunidade para repovoar, criar centralidades, responder a dramas sociais de quem perdeu a casa ou de quem nunca a teve com um mínimo de condições, num pano de fundo de arrendamento social, e nova dinâmica comunitária. Isso comporta desafios, e implica uma visão por parte da banca, e iniciativa por parte das autarquias, ou da Administração Central, a fim de que as Cavaleiras, Tapadas das Mercês, Coopalmes ou Icosais deste concelho possam ser reabilitadas e repovoadas sem incorrer nos erros dum passado recente. Se atentarmos que dos 15000 fogos fechados, 81% são usados ,e 45% são T2, isso dar-nos-á um panorama do mapa habitacional e dos potenciais destinatários: a classe média exaurida pela crise e os jovens que queiram constituir família ou sair de casa dos pais. São pois urgentes programas pró-activos que devolvam vida aos bairros fantasma, e satisfaçam o sagrado direito a uma habitação condigna, intervindo activamente num mercado imobiliário estagnado e com visão social e inclusiva.

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